Artigo

ATIVIDADE ANTIOXIDANTE DE PRÓPOLIS VERDE, MARROM E AVERMELHADA DE REGIÕES QUE CONTÊM ALECRIM-DO-CAMPO (Baccharis dracunculifolia)

Evandro Afonso do Nascimento¹, Sérgio Antônio Lemos de Morais¹, Dorila Piló-Veloso², Roberto Chang² e Débora Costa Reis²
¹ Instituto de Química, Universidade Federal de Uberlândia, 38.400-089 Uberlândia - MG
² Departamento de Química , Universidade Federal de Minas Gerais, 31.270-900 Belo Horizonte - MG

Resumo

O presente trabalho apresenta os resultados da atividade antioxidante frente ao radical difenilpicrilhidrazila (DPPH) de quatro amostras de própolis (duas verdes, uma marrom e outra avermelhada) provenientes de regiões onde o alecrim-do-campo (Baccharis dracunculifolia) é nativo. Surpreendentemente, a própolis marrom apresentou o melhor resultado, em seguida vêm as duas própolis verdes. A atividade antioxidante da própolis avermelhada foi baixa. Ainda mais, a atividade antioxidante aumenta com a concentração de fenóis totais mas nem sempre com a concentração de flavonóides.

Introdução

A própolis é um produto elaborado pelas abelhas com resinas de árvores, cera, pólen, fragmentos de vegetais e secreção própria1,2. Ela é usada para vedar a colméia e protegê-la de ataques de microrganismos. A própolis do arbusto alecrim-do-campo (Baccharis dracunculifolia), conhecida também como própolis verde, é produzida fundamentalmente do broto desta planta3,4 e é altamente eficaz no combate a uma série de microrganismos5. Seus constiutintes ou análogos a eles estão sendo sintetizados em laboratórios e os resultados dos ensaios biológicos feitos até o momento são altamente promissores6.

Embora a própolis verde seja proveniente principalmente do alecrim, há própolis de outras cores que apresentam também grande quantidade do marcador químico característico das própolis do alecrim7. Botanicamente já foi demonstrado que a presença de menos de 10 % de fragmentos de outros vegetais já é suficiente para mudar a coloração da própolis verde3,4.

A oxidação que provoca o envelhecimento de um tecido vivo está diretamente relacionada a oxidantes potentes presentes no organismo e que são conhecidos como radicais livres. A compreensão deste fenômeno tem levado a um consumo cada vez maior de alimentos funcionais os quais contêm antioxidantes capazes de neutralizar esta ação deletéria dos radicais livres8. Recentemente a própolis vem sendo estudada também como uma fonte alternativa para combater essa oxidação9-11. A presença de compostos fenólicos na sua composição a credencia como um potencial agente antioxidante.

No presente trabalho serão apresentados os resultados da atividade antioxidativa de quatro amostras de própolis provenientes de regiôes que contêm alecrim-do-campo e sua relação com o teor de fenóis totais e flavonóides.

Parte experimental

Origem das amostras

As amostras de própolis foram coletadas em diversas cidades de Minas Gerais: Santa Bárbara, Coromandel e São Gotardo. Todas foram armazenadas a uma temperatura de -10 oC.

Extrato etanólico de própolis

O extrato etanólico foi obtido misturando-se 5,00 g de própolis bruta com 400,0 mL de etanol a 95 %. Após 24 h sob agitação periódica e na ausência de luz, filtrou-se a mistura e a solução foi deixada no freezer por 5 horas (para separação da cera) e novamente filtrada.

Determinação de atividade antioxidante com DPPH12

Na determinação de atividade antioxidante com DPPH, a cada 0,25 mL de extrato etanólico de própolis, adicionaram-se 2,0 mL de uma solução recém-preparada de DPPH (1,1-difenil-2-picrilidrazila) em metanol de grau cromatográfico (30 mg/L) e um volume de metanol para completar 5,0 mL. Cada amostra foi deixada na ausência da luz por 90 minutos e após este tempo, as absorbâncias foram lidas no comprimento de onda de 517 nm. O cálculo da atividade antioxidante relativa (AA) é dada pela equação AA % = [Aa - (Ab - Ac)]/Aa x 100, onde Aa é a absorbância da solução de incubação de DPPH sem a adição da amostra; Ab é a absorbância da mistura de incubação contendo o DPPH e a amostra a ser analisada, e Ac é a absorbância da solução em branco sem o DPPH.

Determinação do teor de fenóis totais13

Diluiu-se 1,0 mL do extrato etanólico da própolis com 49,0 mL de água destilada em um balão volumétrico. A uma alíquota de 0,5 mL dessa solução, adicionaram-se 2,5 mL de uma solução aquosa a 10% do reativo de Folin-Ciocalteau e 2,0 mL de uma solução recém preparada de carbonato de sódio a 7,5%. Manteve-se esta mistura em um banho-maria a uma temperatura de 50 oC por 5 min. Esfriou-se a amostra e fez-se a medida de sua absorbância a 760 nm contra um branco contendo os reagentes e água no lugar da amostra. Juntamente com estas medidas, fez-se a preparação de uma reta de calibração com soluções aquosas de ácido gálico nas concentrações de 5, 10, 20 , 40 e 80 µg por 0,5 mL. A este volume foram acrescentados 2,5 mL do reagente de Folin-Ciocalteau e 2,0 mL de solução de carbonato de sódio, totalizando-se os 5,0 mL correspondentes a cada ensaio. A leitura foi feita contra um branco de água.

A solução padrão inicial de ácido gálico foi obtida a partir de 20 mg dissolvidos em 50,0 mL de etanol a 95%.

Determinação do teor de flavonóides14

A 2,0 mL do extrato etanólico de própolis adicionaram-se 1,0 mL de solução metanólica a 5% de cloreto de alumínio hidratado (VETEC) e 2,0 mL de metanol de grau espectroscópico. Após 30 minutos, leu-se a absorbância da solução no comprimento de onda de 425 nm. A curva de calibração foi feita com soluções de quercetina (Sigma-Aldrich) em metanol nas concentrações de 5, 10, 20, 30 e 40 µg por 2,0 mL. A este volume foram acrescentados 1,0 mL de solução de cloreto de alumínio e 2,0 mL de metanol, totalizando-se o volume final de 5,0 mL de cada ensaio. A leitura foi feita contra um branco contendo apenas os volumes de metanol e a solução de cloreto de alumínio.

Resultados e discussão

A Tabela 1 apresenta a atividade anti-radicalar/antioxidante das própolis estudadas.

Tabela 1. Atividade antioxidante de várias própolis

Própolis Atividade (%)
PMC 67,28
PSB 50,31
PSG 40,74
PAC 18,21


A amostra de própolis marrom PMC apresentou maior atividade antioxidante que as amostras de própolis verdes PSB e PSG. Estas duas últimas amostras apresentam atividades próximas. Os valores encontrados para PSB e PSG se encontram dentro dos valores normalmente encontrados na literatura9,10, entretanto, Kumasawa e colaboradores relataram um valor da atividade antioxidante de aproximadamente 33% para a própolis verde brasileira que analisaram. A amostra de própolis avermelhada PAC apresentou a menor atividade antioxidante.

A amostra PMC mostra uma atividade superior às outras amostras e se iguala às melhores até hoje relatadas na literatura9. Este resultado sugere que o preconceito que se tem contra a própolis marrom (e sua conseqüente desvalorização no mercado quando comparada à própolis verde) pode não ter fundamento científico. Comparada com várias amostras de própolis verde, a própolis marrom se situou entrea as que apresentaram maior quantidade de marcador químico característico de própolis de alecrim7. Ou seja, é perfeitamente possível que ela tenha até mais resina de alecrim, porém mais fragmentos de outros vegetais e, em compensação, menos cera. Daí adviria sua maior atividade antioxidante, por exemplo.

Os resultados acima indicavam que a própolis marrom deveria apresentar um teor bastante alto de fenóis10 , o que foi confirmado pelas análises de fenóis totais e do teor de flavonóides. A Tabela 2 apresenta estes resultados.

Tabela 2. Teores de fenóis totais em equivalentes de ácido gálico e de flavonóides em equivalentes de quercetina das várias própolis estudadas.

Amostras Fenóis Totais Flavonóides
mg (equivalentes de ácido gálico) /g própolis bruta mg (equivalentes de quercetina) /g própolis bruta
PMC 151 31,3
PSB 110 12,6
PSG 90 5,0
PAC 29 5,1


A própolis PMC apresentou 37% a mais de fenóis do que a própolis PSB, confirmando, assim, a dependência da atividade antioxidante da concentração de fenóis totais. Entretanto, a análise mais detalhada da Tabela 2 mostra que a atividade antioxidantes das própolis não pode ser relacionada à concentração de flavonóides uma vez que PSB tem mais do dobro da conentração de flavonóides do que a PSG e esta quase a mesma quantidade que a PAC.

Os valores encontrados para os fenóis totais e flavonóides estão superiores àqueles encontrados por Kumasawa e colaboradores9 , mas inferiores aos encontrados por Park e colaboradores11. Kumasawa e colaboradores não citam a concentração do álcool utilizado na extração e Park e colaboradores usaram álcool a 80 %, portanto, contendo mais água, a qual promove maior extração de flavonóides do que o etanol a 95% que foi utilizado no presente trabalho.

Os teores de flavonóides em equivalentes de quercetina encontrados estão de acordo com os valores estabelecidos no anexo VI do Regulamento Técnico para a fixação de identidade e qualidade de própolis15, que classifica as própolis e seus extratos quanto ao teor de flavonóides como: mínimo > 0,5%; baixo teor: até 1,0 %; de médio teor, entre 1,0 e 2,0 % e de alto teor , acima de 2,0 % . Sendo assim, as amostras estariam com teores que as qualificariam como própolis de teor médio e alto de flavonóides.

Conclusões

As própolis verdes e marrom de Coromandel apresentaram atividade antioxidante característica de própolis do Grupo XII da classificação de Y. K. Park. A maior atividade antiantioxidante apresentada pela própolis marrom está relacionada a sua maior concentração de fenóis.

A própolis avermelhada apresentou o menor poder antioxidante dentre as quatro amostras analisadas, era a que possuía a menor concentração de fenóis.

Finalmente, quanto maior a concentração de fenóis totais tanto maior a a tividade antioxidante; o mesmo não se pode dizer com respeito à concentração de flavonóides.

Agradecimentos

Ao Instituto de Química da UFU.

Referências

1. Ghisalberti, E. L.; Bee World 1979, 60, 59.

2. Marcucci, M. C.; Quim. Nova 1996, 19, 529.

3. Oliveira, V. D. C; Bastos, E. M.; Acta Bot. Bras. 1998, 12, 431.

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5. Park, Y. K.; Ikegaki, M.; Alencar, S. M.; Moura, F. F.; Honeybee Sci. 2000, 21, 85.

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11. Park, Y. K.; Fukuda, I.; Ashida, H.; Nishiumi, S.; Yoshida, K.-I.; Daugsch, A.; Sato, H. H.; Pastore, G. M. J. Agric. Food Chem. 2005, 53, 10306.

12. Brand-Williams, W.; Cuvelier M. E.; Berset, C.; Lebensm. Wis. Technol. 1995, 28, 25.

13. Morais, S. A. L.; Nascimento, E. A.; Queiroz, C. R. A. A.; Piló-Veloso, D.; Drumond, M. G.; J. Braz. Chem. Soc. 1999, 10, 447.

14. Woisky, R. G.; Salatino, A.; J. Apic. Res. 1998, 37, 99.

15. DOU de 19/01/2001; Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento, Secretaria de Defesa Agropecuária. Instrução Normativa No 3 (ANEXO VI), 18.

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