Artigo

A Iniciativa Brasileira de Polinizadores: progressos e perspectivas

Braulio Ferreira de Souza Dias. Ministério do Meio Ambiente. Ed. Ibama Sede, Trecho 2, Bloco H, 70818-900, Brasília / DF.
Érica Frazão Pereira. Ministério do Meio Ambiente. Ed. Ibama Sede, Trecho 2, Bloco H, 70818-900, Brasília / DF.
Vera Lucia Imperatriz Fonseca. Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto. Universidade de S. Paulo. Av Bandeirantes, 3900. CEP 14040-901

Temos tratado do tema: Iniciativa Brasileira de Polinizadores, nos Congressos de Apicultura e em revistas de apicultores (ver Imperatriz-Fonseca et al., 2004; Imperatriz-Fonseca et al, 2005; Freitas e Imperatriz-Fonseca, 2005) por este tema ser de grande importância para os apicultores e meliponicultores, além do público em geral (Imperatriz-Fonseca 2005). Na verdade, este é um tema transversal a todos os programas de Conservação Biológica e segurança alimentar, isto é, qualquer que seja a região estudada e a área a ser preservada, na cadeia alimentar e na produção de frutos se destacam os polinizadores, que transportam os gametas masculinos de uma planta para outra, promovendo a fertilização cruzada. Na agricultura moderna a produção de alguns frutos em estufas, como por exemplo o tomate (Velthuis et al., 2004), muito se beneficia da utilização de polinizadores em estufas. O mesmo ocorre, por exemplo, com o pimentão, que pode ser polinizado pela jandaíra Melipona subnitida (Cruz et al, 2005; Silva et al, 2005), com o morango, que é polinizado também pela jataí Tetragonisca angustula (Malagodi-Braga et al, 2004).

O Brasil liderou o processo de levantamento deste tema, relacionado com o uso da biodiversidade na agricultura, na Convenção da Diversidade Biológica (CDB). Assim sendo, em 2000, na Conferência das Partes (COP5) realizada naquele ano em Nairobi, foi aprovada a Iniciativa Internacional de Polinizadores. No Brasil, os primeiros trabalhos para formatar esta iniciativa, chamaram a atenção dos especialistas para a necessidade de um trabalho conjunto e interdisciplinar para o avanço nesta área. Foram dois grandes esforços paralelos: o do Ministério do Meio Ambiente, liderado sempre por Braulio S.F. Dias, e o da comunidade científica, conduzidos pela Dra. Vera Imperatriz-Fonseca com o apoio de muitos colaboradores (Breno Magalhães Freitas, Marina Siqueira de Castro, Antônio Mauro Saraiva, Lionel S. Gonçalves, Isabel Alves dos Santos, Cynthia Pinheiro Machado, Fernando Silveira, Claudia Maria Jacobi, Rogério Gribel, Carlos Alberto Garófalo, David de Jong, Vanderlei Canhos, entre muitos outros).

A tarefa de falar sobre polinizadores e atrair a atenção do público não é fácil. A princípio, os principais polinizadores são alguns vertebrados, como morcegos e aves, além dos insetos. As abelhas são mais conhecidas, porém, principalmente pela produção de mel. Por isso, há a necessidade de se atentar para o lado prático do problema, ou seja, quais são os polinizadores, para que servem e o que podem alterar na produção de alimentos, realizando uma ampla divulgação pelos meios de comunicação. Este assunto foi tratado num workshop realizado na África do Sul em maio de 2003, e o guia para governos sobre este programa foi lançado na COP8 de Curitiba, em versão em inglês .

A comunidade científica organizou-se para o programa de polinizadores através de reuniões temáticas, como por exemplo, a organizada por Breno Magalhães Freitas no Ceará, em maio de 2004, que tratou das abelhas solitárias e seu uso para polinização, sendo que o material produzido encontra-se on line (www.webbee.org.br ). Em 2003, foi realizada com apoio da FAO (Food and Agricultural Organization), do MMA (Ministério do Meio Ambiente), do MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia) e da USP, uma reunião, denominada SP+5, para avaliar a situação de prioridades de trabalho no Brasil para o programa dos polinizadores, cinco anos após a primeira grande reunião internacional para formatar este programa, realizada na USP (Universidade de S. Paulo) em outubro de 1998. Os resultados também foram publicados pela Holos Editora na forma de um livro, lançado na COP8, com o apoio da Conservação Internacional-Brasil (Bees as pollinators in Brazil: assessing the status and suggesting the best practices).

A Iniciativa Brasileira de Polinizadores (IBP), está inserida no âmbito do Projeto FAO - Organização Mundial para Agricultura e Alimentação (nº EP/GLO/301/GEF) "Conservação e Manejo de Polinizadores para a Agricultura Sustentável através de uma Abordagem Ecossistêmica", sendo que a FAO é a agência executora global e o Ministério do Meio Ambiente, realiza este papel em nível nacional, o PNUD - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, é a agência implementadora e o GEF - Fundo Mundial para o Meio Ambiente, a agência financiadora. O Projeto Global engloba 7 países em desenvolvimento, Brasil, Gana, Índia, Quênia, Nepal, Paquistão e África do Sul.

O objetivo do projeto global é promover e assegurar a produtividade das culturas agrícolas de comunidades rurais, bem como a segurança alimentar, através do conhecimento, entendimento e conscientização dos múltiplos benefícios dos serviços prestados pelos polinizadores. O objetivo imediato será identificar a nível mundial, práticas de manejo de uso sustentável, tecnologias e políticas que promovam impactos positivos e minimizem impactos negativos da agricultura na diversidade e atividade de polinizadores. O Projeto está tem previsão de duração de cinco anos, com início em 2006 e término em 2011.

O Ministério do Meio Ambiente, em 2005, oficializou a Iniciativa Brasileira de Polinizadores através de uma Portaria Interministerial, designando seus membros, com representantes de vários setores da Sociedade Civil. Esta comissão ampla deverá acompanhar os esforços de fundos para um programa nacional de polinizadores, que está em fase final de julgamento contando com um apoio do GEF (Global Environmental Facility), que é o mecanismo financeiro da CBD (Convenção da Diversidade Biológica). O MMA realizou duas reuniões de Consulta Nacional sobre os polinizadores, com o objetivo de demonstrar a importância do tema para os diversos setores da sociedade, com a participação de pesquisadores, representantes de instituições governamentais e não-governamentais, representantes de empresas públicas e privadas, criadores de abelhas, comunidade acadêmica, dentre outros. A partir dessas reuniões foram estabelecidas parcerias de contrapartida "in kind" (ou seja, em trabalho, no uso de equipamentos, infraestrutura de instituições, salários, etc.) e "in cash" (em dinheiro vivo). O valor de doação do GEF para os países envolvidos no Projeto Global será de US$ 6.000.000,00, sendo que US$ 1.835.770,00 serão destinados apenas à IBP (Iniciativa Brasileira de Polinizadores). Todos os países envolvidos no projeto tiveram a tarefa de alavancar uma contrapartida nacional de pelo menos 2:1. O Brasil fechou diversas parcerias nacionais oficializadas por meio de correspondências dos diversos parceiros, dentre ministérios, instituições e empresas dos setores público e privado, universidades, ONGs, dentre outros. Os valores fechados como contrapartida nacional foram de US$ 6.171.760,20 in kind e US$ 7.590.434,00 in cash.

Com os resultados do projeto pretende-se promover e expandir a conscientização sobre o valor da diversidade de polinizadores e os múltiplos benefícios e serviços promovidos por eles para uma produtividade sustentável, aumentando dessa maneira o entendimento, conservação e uso sustentável de polinizadores através de uma abordagem ecossistêmica em países selecionados que adotem práticas de agricultura sustentável. A partir da implementação e dos resultados gerados pelo Projeto, almeja-se que as informações geradas sirvam como base para futuros projetos e planos de manejo e que a conscientização dos diversos setores da sociedade, esses conhecimentos sejam perpetuados e incrementados.

O MMA, no decorrer do ano de 2005, também realizou pequenas reuniões com o Comitê Técnico Científico, cujos representantes são membros designados na Portaria, para tratar de assuntos e tarefas levantadas pela FAO, e ainda, está financiando 13 projetos de polinização de culturas, através do Probio. Foram realizados trabalhos com diferentes culturas de importância agrícola nacional e/ou regional, como maracujá, tomate, algodão, acerola, açaí, mangaba, graviola, cupuaçu, murici e anonáceas.

Os projetos de polinização do Probio encontram-se em fase de conclusão e alguns relatórios finais já estão prontos. Estes projetos estão trazendo um grande avanço para o conhecimento da importância econômica das abelhas na polinização e para o desenvolvimento de respectivos planos de manejo. Resultados finais e parciais deste programa serão apresentados no próximo Encontro de Abelhas de Ribeirão Preto, em julho de 2006. Os recursos do MMA são disponibilizados aos interessados através de editais públicos. O MMA publicou para a COP8, realizada em Curitiba, em Março de 2006, a Bibliografia Brasileira sobre Polinização e Polinizadores e a segunda edição do livro do workshop de 1998 que deu a formatação necessária a este programa internacional de conservação e uso sustentado de polinizadores (Pollinating bees: the conservation link between nature and agriculture).

O Projeto Global no qual a IBP está inserida, teve sua fase de PDF-B concluída, com o fechamento do corpo do projeto e está em fase de aprovação pelos organismos nacionais e pelo GEF. No decorrer do processo de elaboração final do projeto houve alguns percalços, e a expectativa de que ele fosse aprovado no orçamento do GEF III teve que ser postergada, tendo sido transferido para a aprovação no GEF IV, que ocorrerá em meados do segundo semestre.

Gargalos do programa

Infelizmente, até o momento, praticamente não se disponibiliza de informações em português para o grande público. O primeiro esforço foi concentrá-las na revista Mensagem Doce, em um número que tratou especificamente deste tema, em 2005. Este número 80 está on line para os interessados, mas a revista esgotou-se. Por isso mesmo considera-se prioridade máxima para este programa a organização de divulgação científica em português aos usuários de vários segmentos que podem atuar e se beneficiar dos polinizadores.

Entre os beneficiários do programa estão os apicultores e meliponicultores, pois as colônias de abelhas terão também valor para uso em agricultura. Manejo especial para transporte de abelhas deverá ser feito para esta finalidade. A produção dos ninhos em larga escala é prioridade também para meliponicultores. Aconselha-se sempre a criação de espécies locais.

O futuro

Este tema, abelhas para produção de alimento e para conservação ambiental, está crescendo muito. Os meliponicultores estão integrados, comunicando-se através de várias mídias, e suas práticas e experiências pessoais são disseminadas e testadas. Há ainda assuntos pouco compreendidos por eles e pelos cientistas, mas caminha-se no sentido de melhorar a troca de experiências e de se realizar uma colaboração mais estreita. O progresso é visível (vejam, por exemplo, quantos somos nos congressos de meliponicultura!). Propostas de integração de conhecimento iniciam-se, e o objetivo próximo é treinar repassadores para atingir as propriedades rurais e a economia rural.

Alguns estados brasileiros, como a Bahia, por exemplo, através da FAPESB (Fundação de amparo à Pesquisa do Estado da Bahia), já estão desenvolvendo seus programas de polinizadores, implementando a pesquisa local. A FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de S. Paulo), em S. Paulo, acaba de aprovar um projeto integrado no programa Biota para esta finalidade. Este exemplo deverá se multiplicar pelo Brasil, através de redes temáticas.  

Referências  

CRUZ, D. O. ; FREITAS, B. M. ; SILVA, L. A. ; SILVA, E. M. S. ; BOMFIM, I. G. A. . Pollination efficiency of the stingless bee Melipona subnitida on greenhouse sweet pepper (Capsicum annuum). Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 40, n. 12, p. 1197-1201, 2005

IMPERATRIZ-FONSECA, V.L. 2005.Polinizadores no cenário mundial e no brasileiro. In: Anais da Reunião da SBPC, Fortealeza, in CDROM

IMPERATRIZ-FONSECA, V.L.; CONTRERA, F.A.L & KLEINERT, A.M.P.- 2004- A Iniciativa Brasileira dos Polinizadores e a meliponicultura. In: Anais do XV Congresso Brasileiro de Apicultura e I Congresso Brasileiro de Meliponicultura. Natal. In CDROM.

IMPERATRIZ-FONSECA, VL;GONÇALVES, LS; JONG,DD; FREITAS, B.M.; CASTRO, M.S.;ALVES DOS SANTOS, I.;VENTURIERI, G. 2005 . As abelhas e o desenvolvimento rural no Brasil.Mensagem Doce, n.80, p.3-18.

IMPERATRIZ-FONSECA. V.L.;DE JONG, D. & SARAIVA. A.M.(eds).-2006. Bees as Pollinators in Brazil: assessing the status and suggesting the best practices. Holos Ed., Ribeirão Preto, 114p.

FREITAS, B.M. & IMPERATRIZ-FONSECA,VL.2005. A importância econômica da polinização. Mensagem Doce,v.80, p.44-46

MALAGODI-BRAGA, KS & KLEINERT, AMP- 2004. Could Tetragonisca angustula Latreille (Apinae, Meliponini) be used as a strawberry pollinator in greenhouses? Australian Journal of Agricultural Research, v.55, p. 771-773.

MALAGODI-BRAGA, KS; KLEINERT, AMP & IMPERATRIZ-FONSECA,VL- 2004- As abelhas sem ferrão e a polinização. Teconologia e Ambiente, Criciúma, v.10, p. 59-70.

SILVA, E. M. S. ; FREITAS, B. M. ; SILVA, L. A. ; CRUZ, D. O. ; BOMFIM, I. G. A. .2005. Biologia floral do pimentão (Capsicum annuum) e a utilização da abelha jandaíra (Melipona subnitida) Ducke como polinizador em cultivo protegido. Revista Ciência Agronômica, Fortaleza, v. 36, n. 3, p. 386-390.

VELTHUIS, HHW & VAN DOORN, A. 2004.The breeding, commercialization and economic value of bumblebees. In: Freitas, BM & Pereira (JOP) eds, Solitary bees: conservation, rearing and management for pollination, Fortaleza, Imprensa Universitária, p. 135-149

Retorna à página anterior