Resumos Técnicos-Científicos

Perspectivas e Desafios para o uso da Suplementação Artificial Protéica em Colônias de Abelhas Apis mellifera

Michelle Manfrini Morais1, Aline Patrícia Turcatto2 e Tiago Maurício Francoy3
1 Universidade Federal de São Paulo/Unifesp - Depto de Ciência e Tecnologia michelle.manfrini@unifesp.br
2 Universidade de São Paulo/USP - Depto de Genética alinepatricia@usp.br
3 Universidade de São Paulo/USP - EACH tfrancoy@usp.br

A nutrição adequada é a base para o crescimento e desenvolvimento de colônias de abelhas do gênero Apis mellifera (Brodschneider & Crailsheim, 2010). Para tal, as abelhas requerem em sua alimentação: proteínas, carboidratos, minerais, lipídios, vitaminas e água para o seu crescimento e desenvolvimento normal. Estas necessidades normalmente são supridas pela coleta de néctar, pólen e água. Dessa forma, o tipo e a quantidade de alimento coletado (néctar ou pólen) são selecionados pelas operárias, sendo que no decorrer do dia, elas podem alterar o tipo de coleta para atender às exigências da colméia (Free, 1980). Para as abelhas, pólen é a fonte natural de proteína, mas diferentemente do mel, ele não é fácil de estocar (Pernal & Currie, 2001). Precisa ser consumido logo após ser coletado, pois de outra maneira perde muito do seu valor nutritivo. As abelhas estocam um pouco de pólen nos seus ninhos na forma de "bee bread" (pão da abelha). "Bee bread" é uma mistura de pólen e mel, algumas enzimas (incluindo invertase), secreções glandulares das abelhas e microorganismos (Pseudomonas, Lactobacillus, e Saccharomyces sp.), que ajudam a proteger a mistura de pólen dos microorganismos deletérios, reduzindo o pH (Winston, 1987; Herbert, 1992). Os microorganismos contidos no "bee bread" também melhoram o valor nutricional do pólen estocado, aumentando o conteúdo vitamínico e alterando a composição de aminoácidos (Cremonez et al., 1998). A coleta desses alimentos pode ficar dificultada em épocas de pouca disponibilidade, sendo dessa maneira, a alimentação artificial muito importante nestes casos, tanto para a manutenção da colônia como para o crescimento e multiplicação do número de colméias. O crescimento e a manutenção das colônias são limitados pela quantidade de proteína disponível; a longevidade, a quantidade de cria e a produção de mel são reduzidas quando o consumo de proteína é inadequado (Herbert, 1992).

Carências de pólen podem ocorrer em qualquer época do ano e afetam o desenvolvimento da colônia. A carência de pólen pode ocorrer, por exemplo, quando as abelhas estão freqüentando plantas que produzem muito néctar e pouco pólen (Stanger & Laidlaw, 1974; Johansson & Johansson, 1977). Nas épocas de carência, as reservas de pólen nos favos e reservas de proteína nas abelhas logo são gastos de modo que pólen ou substitutos de pólen são necessários para manter colônias fortes para a polinização ou para a produção de mel. Assim, o fornecimento de dietas artificiais alternativas ou substitutos de pólen pode ajudar a melhorar o desempenho da colônia (Herbert, 1992). Sendo assim, Herbert & Shimanuki (1979) definiram substituto de pólen como qualquer material que, quando fornecido às colônias de abelhas, supre as necessidades de pólen por um curto período de tempo. O suplemento de pólen, segundo a definição, deve conter proteínas e também pequenas quantidades de pólen, o que aumenta o valor nutritivo da dieta e age como um atrativo. Se não houver pólen ou um bom substituto do mesmo, o desenvolvimento das crias pode diminuir ou até cessar completamente (Haydak, 1963). Entretanto, normalmente, os apicultores oferecem substitutos de pólen para as colônias sem os cuidados relativos à formulação da dieta, à deterioração durante o tempo de estocagem, à atratividade para as abelhas e aos custos dos componentes das dietas (Herbert et al., 1977). Free & Williams (1971) mostraram que o fornecimento de pólen à colônia reduz a quantidade de pólen coletado pelas abelhas, porém quando alimentadas com substituto de pólen durante uma florada, este é pouco consumido e não há mudança aparente na atividade das campeiras. Entretanto, Doull (1980) observou que a alimentação com suplemento de pólen aumenta a produtividade da colônia. Colônias que receberam o suplemento produziram, respectivamente, 38% e 28% de mel a mais por abelha que as colônias que não receberam uma dieta suplementar. Dessa maneira, apicultores e pesquisadores têm experimentado diversos suplementos alimentares, tais como farelo ou farinha de soja, levedura de cana-de-açúcar, farinha láctea, terneron (sucedânio para bezerro), farelo de trigo, glutenose de milho, farelo de polpa de citros, entre outros (Azevedo- Benitez & Nogueira-Couto, 1998; Couto, 1998; Lengler, 2000; Cremonez et al., 1998) que podem ser utilizados na produção de dietas protéicas para as abelhas, tentando dessa maneira, evitar o enfraquecimento das colônias ou a perda por abandono (cerca de 50% de perda em regiões mais castigadas) (Lengler, 2000; Cremonez, 2001). Quando as condições ambientais estão desfavoráveis, a pouca cria existente na colônia pode morrer devido à fome, surgimento de doenças ou ser eliminada pelas operárias, que consomem parte da cria para saciar a falta de alimento (Crailsheim, 1990). Para tentar solucionar esses problemas, vários parâmetros têm sido usados para identificar o alimento mais eficaz, entre estes: consumo do alimento (Nabors,1996), desenvolvimento e peso das colônias (Silva, 1997), produção de geléia real e desenvolvimento da glândula hipofaríngea (Azevedo-Benitez & Nogueira-Couto, 1998), longevidade das operárias (Horr, 1998; Cremonez, 2001), infestação do ácaro Varroa destructor (Garcia et al., 1986), produção de mel (Abbas et al., 1995), e capacidade imunológica e teor protéico na hemolinfa das abelhas (Cremonez, 2001). Assim, apesar da diversidade da flora apícola no país, devido ao seu tamanho, encontramos diversas realidades nutricionais. Como exemplo, no Nordeste brasileiro, durante a estação seca, ocorre uma escassez de pasto apícola e, conseqüentemente, de alimento para as abelhas (Pereira et al., 2006). Por conseguinte, todo ano os apicultores perdem uma grande parte das suas colônias, que abandonam os apiários em busca de novos pastos no período de escassez de alimento (Freitas, 1991; Lima, 1995). Dessa forma, a falta de recursos para adquirir o alimento e o desconhecimento de produtos que possam ser oferecidos às abelhas são os motivos que impedem a alimentação adequada das colônias no período necessário. O uso de dietas artificiais pode resolver parcialmente esse problema. Além do suprimento da fonte proteica no período de escassez de alimento na natureza, os substitutos de pólen podem ser utilizados por apicultores para a fortificação de enxames coletados na natureza e para ajudar na multiplicação dos ninhos através da divisão de colônias. Dessa maneira, esta alimentação suplementar visa o crescimento rápido das colônias para que estejam mais fortes e em melhores condições para forrageamento, para a coleta de néctar ou para atender demandas de polinização.

Mesmo com todas essas informações sobre a importância da utilização de suplementos artificiais proteicos para as diversas finalidades citadas acima, uma das maiores reclamações dos apicultores Brasileiros é em relação à falta de apoio tecnológico, bem como dietas/receitas disponíveis para a alimentação das abelhas. Sabe-se que tal alimentação visa o cresimento rápido das colônias para que estejam mais fortes e em melhores condições para forrageamento, para a coleta de néctar ou para atender demandas de polinização (Morais et al., 2012). Dentro deste contexto, pesquisas vêm sendo desenvolvidas no sentido de encontrarmos uma ração de boa aceitabilidade e qualidade para as abelhas em uma parceria pioneira da união de Universidades (Unifesp e USP) e Associação de Apicultores do Centro-Oeste de Minas Gerais com resultados parciais positivos.

Referências Bibliográficas

ABBAS, T.; H. ABID & R. ALI. 1995. Black gram as a pollen substitute for honey bees. Animal Feed Science and Technology 54:357-359.

AZEVEDO-BENITEZ, A. L. G. & R. H. NOGUEIRA-COUTO. 1998. Estudo de algumas dietas artificiais visando à produção de geléia real em colônias de Apis mellifera. In: III ENCONTRO SOBRE ABELHAS, Ribeirão Preto, SP, 227-230.

BRODSCHNEIDER, R. & CRAILSHEIM, K. 2010. Nutrition and health in honey bees. Apidologie 41, 278-291.

COUTO, L.A. 1998. Nutrição de abelhas. In: XII CONGRESSO BRASILEIRO DE APICULTURA, Salvador. BA, 92-95.

CRAILSHEIM, K. 1990. The protein balance of the honey bee worker. Apidologie 21: 417-429.

CREMONEZ, T. M. 1996. Avaliação de métodos para determinação da eficiência de dietas protéicas em abelhas Apis mellifera. Dissertação de Mestrado apresentada à FFCLRP-USP, Ribeirão Preto, 103 p.

CREMONEZ, T. M. 2001. Influência da nutrição sobre aspectos da fisiologia e nutrição de abelhas Apis mellifera. Tese de Doutorado apresentada à FFCLRP-USP, Ribeirão Preto, 87 p.

CREMONEZ, T. M., D. DE JONG & M. M. G. BITONDI. 1998. Quantification of hemolymph proteins as a fast testing protein diets for honey bees (Hymenoptera: Apidae). Journal of Economic Entomology 91: 1284-1289.

DOULL, K. M. 1980. Relationships between consumption of a pollen supplement, honey production, and broodrearing in colonies of honeybees Apis mellifera L. Apidologie 11: 367-374.

FREE, J. B. 1980. A organização social das abelhas (Apis) E.P.U., EDUSP, São Paulo.

FREE, J. B. & I. H. WILLIAMS. 1971. The effect of giving pollen and pollen supplement to honeybee colonies on the amount of pollen collected. Journal of Apicultural Research 10: 87-90.

FREITAS, B. M. 1991. Potencial da caatinga para a produção de pólen e néctar para exploração apícola. Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 140 p.

HAYDAK, M. H. 1963. Influence of storage on the nutritive value of pollen for brood rearing by honeybees. Journal of Apicultural Research 2: 105- 107.

HERBERT JR., E. W. 1992. Honey Bee Nutrition. In The Hive and The Honey Bee. Graham, J. M. (ed), Dadant & Sons. Hamilton, Illinois, 197- 233.

HERBERT JR., E. W., H. SHIMANUKI & D. CARON. 1977. Optimum protein levels required by honey bees (Hymenoptera: Apidae) to initiate and maintain brood rearing. Apidologie 8: 141-146.

HERBERT JR., E. W. & H. SHIMANUKI. 1979. Seasonal protein preferences of free flying colonies of honey bees. American Bee Journal 119: 298-302.

HORR, B.Z. 1998. Salt - an important dietary supplement in honey bee nutrition? American Bee Journal 138: 662-669.

JOHANSSON, T. S. K. & M. P. JOHANSSON. 1977. Feeding honeybees pollen and substitutes. Bee World 58: 105-118.

LENGLER, S. 2000. Alimentação artificial de abelhas. In: XIII Congresso Brasileiro de Apicultura, Florianópolis, SC, 98-102.

LIMA, A. O. N. 1995. Pólen coletado por abelhas africanizadas em apiário comercial na caatinga cearense. Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 118 p.

MORAIS, M.M., MESSAGE, D., DE JONG, D. & GONÇALVES, L.S. 2012. Perspectivas e Desafios para o Uso das Abelhas Apis mellifera como Polinizadores no Brasil In: Polinizadores no Brasil - contribuição e perspectivas para a biodiversidade, uso sustentável, conservação e serviços ambientais ed. São Paulo: EDUSP, v.I, p. 01-485.

NABORS, R. A. 1996. Using mixtures of different sugars to feed bees. American Bee Journal 135: 785-786.

PEREIRA, F. M., FREITAS, B. M., NETO, J. M. V., LOPES, M. T. R., BARBOSA, A. L. & CAMARGO, R. C. R. 2006. Desenvolvimento de colônias de abelhas com diferentes alimentos protéicos. Pesquisa Agropecuária Brasileira 41: 1-7.

PERNAL, S. F., CURRIE, R. W. 2001. The influence of pollen quality on foraging behavior in honeybees (Apis mellifera L.). Behavioral Ecology and Sociobiology 51: 53-68.

SILVA, F. T. A. 1997. Comparação entre pasta de soja (Glycine max) e pasta de jatobá (Hymenaeae spp.) como alimentação suplementar para Apis mellifera. Monografia apresentada à Universidade Federal do Piauí, Terezina, 16 p.

STANGER, W. & H. H. LAIDLAW. 1974. Supplemental feeding of honeybees. American Bee Journal 114: 138-141.

WINSTON, M. L. 1987. The biology of the honey bee. . Harvard University Press, Cambridge, MA.

Retorna à página anterior