Artigo

Qualidade do mel de Apis mellifera L., 1758 (HYMENOPTERA, APIDAE) comercializado no município de Cuiabá, Estado de Mato Grosso.

Nesvaldo Bento OLIVEIRA1, Lídia Maria Ruv Carelli BARRETO2.
1Coordenadoria de Pesquisa, EMPAER-MT, Rua Jarí Gomes, 454, Bairro Boa Esperança, Cep 78068-225, Cuiabá-MT. E-mail: nesvaldo_empaer@yahoo.com.br
2 Departamento de Ciências Agrárias, Centro de Estudos Apícolas/UNITAU, Estrada Dr. José Luiz Cembranelli, 5000, Cep 12081-010, Bairro do Itaim, Taubaté, SP.

RESUMO
O Brasil possui reservas florais que podem proporcionar milhares de toneladas de mel, de primeira qualidade aceito pelos mercados mais exigentes do mundo. O mel na cidade de Cuiabá vem sendo comercializado sem o mínimo controle pelas autoridades. Muitos pontos comerciais vendem o mel de forma irregular, de procedência duvidosa, encontrando o produto fracionado em recipientes de vidros e plásticos (litros, potes e outros) reutilizados. O mel de abelha é um produto muito apreciado, no entanto, de fácil adulteração com açucares e xarope. Com o objetivo de contribuir para a avaliação da qualidade do mel comercializado no Município de Cuiabá, Estado de Mato Grosso, foram avaliadas 37 amostras de méis por meio de análises físico-quimicas (umidade, reação de lugol, reação de lund, reação de fiehe, sólidos insolúveis e cinzas). Os resultados foram comparados com os limites estabelecidos pela Instrução Normativa n° 11, de 20 de outubro de 2000 e de acordo com as normas analíticas do INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Onze amostras (29,73%) apresentaram umidade superior a 20%; seis amostras (16,22%) apresentaram na reação de lugol a presença de amido e dextrinas; na reação de lund, nenhuma amostra foi reprovada; seis amostras (19,35%) na reação de fiehe foram reprovadas, indicando a presença substâncias produzidas durante o superaquecimento ou a adição de xaropes de açúcares; dezenove amostras (79,17%) apresentaram sólidos insolúveis fora dos padrões exigidos pela legislação (0,1%); uma amostra apresentou 3,19% de cinzas, representando 20% das amostras. Pela qualidade dos méis avaliados, pode-se concluir que somente quatro amostras (10,81%) estão qualificadas para serem comercializas para o consumo humano de acordo com a legislação, uma percentagem considerável (89,19%) das amostras de méis está, portanto fora das normas de qualidade do mel brasileiro. Desta forma, é necessário que haja algumas análises para a determinação da sua qualidade para que seja comercializado.

PALAVRAS-CHAVE: Apis mellifera, análise físico-química, controle de qualidade.

ABSTRACT

Brazil possess floral reserves that can provide thousand of tons of first quality, accepted for the most demanding markets of the world. The honey in the city of Cuiabá comes being commercialized without the minimum control for the authorities. Many commercial points sell it in an irregular form, of origin doubtful, finding the product in reused glass containers and plastics (liters, pots and others). The honey is a product very appreciated, however, of easy adulteration with you sweeten and boiled must. The aim of this study is contribute for the evaluation of the quality of the honey commercialized in the City of Cuiabá, State of Mato Grosso. It had been evaluated 37 samples of honeys by the physicist-chemistries analyses (insoluble humidity, reaction of lugol, reaction of lund, reaction of fiehe, solids and ashes). The results had been compared with the limits established for Normative Instruction n º 11, of 20 of October of 2000 and in accordance with the analytical norms of the INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Eleven samples (29.73%) had presented superior humidity 20%; six samples (16.22%) had presented in the reaction of lugol the starch presence and dextrinas; in the reaction of lund, no sample was disapproved; six samples (19.35%) in the reaction of fiehe had been disapproved, indicating the presence substances produced during the overheating or the addition of boiled musts of sugars; nineteen samples (79.17%) had presented insoluble solids are of the standards demanded for the legislation (0.1%); a sample presented 3.19% of leached ashes, representing 20% of the samples. For the quality of the evaluated honeys, it can be concluded that four samples (10.81%) are only qualified to be in accordance with commercialize for the human consumption the legislation, a considerable percentage (89.19%) of the samples of honeys is, therefore it are of the norms of quality of the Brazilian honey. In such a way, it is necessary that it has some analyses for the determination of its quality so that is commercialized.

KEY- WORDS: Apis mellifera, physicist-chemistry, quality control.

1. INTRODUÇÃO

A apicultura tem se destacado como uma atividade de benefícios sociais, econômicos e ecológicos. Em todo o país, milhares de empregos são gerados nos serviços de manejo das abelhas, fabricação e comércio de equipamentos, beneficiamento dos produtos e polinização de culturas agrícolas (VARGAS, 2006).

Por muitos séculos, o mel de abelhas foi o único produto adoçante conhecido e usado pelos homens. Até onde se têm registros, o mel já era utilizado, pelos sumérios, desde 5.000 anos a.C. (MONTES, 2006). Durante este período, a apicultura tinha por finalidade apenas a obtenção de mel e cera. Atualmente, a apicultura moderna e industrial se dedica, alem da produção de mel e cera, a produção de própolis, pólen, geléia real, polinização e apitoxina.

No Brasil, a apicultura gera 450 mil ocupações diretas no campo e 16 mil empregos diretos no setor industrial, sendo 9 mil na indústria de processamento (entrepostos) e 7 mil na indústria de insumos (materiais e equipamentos). Atualmente, nosso país é o 11º produtor mundial de mel, sendo que em 2006, a produção medida pelo IBGE foi de 36,7 mil toneladas de mel. Os 12 maiores Estados produtores são: RS (7,82 mil toneladas), PR (7,8 mil t), PI (4,61 mil t), SC (4,20 mil t), CE (3,99 mil t), SP (3,05 mil t), MG (2,54 mil t), BA (2,48 mil t), PE (2,05 mil t), RN (585 t), MA (559 t) e MS (485 t) (RESENDE, 2008).

Segundo o IBGE, o estado do Mato Grosso em 2006 produziu 365 toneladas de mel, o que representa um grande salto na produção, podendo em breve configurar entre os grandes produtores de mel citados acima.

No comércio de Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso, o mel é comercializado sem o devido monitoramento de um controle de qualidade eficiente que assegure a população um produto inspecionado e certificado. A aquisição do produto, fora dos padrões mínimos de higiene, para o consumo pode trazer grandes males aos consumidores, em especial às crianças. O mel tem sido adquirido para a fabricação de fitoterápico (remédios caseiros), para tratamento de doenças respiratórias e outras enfermidades. Sistematicamente os consumidores têm demonstrado grande preocupação com a qualidade e com as constantes adulterações de amostras de mel.

Dentro deste contexto e diante da escassez de informações "sobre as características físico-químicas para avaliar existência de passiveis adulterações e fraudes", necessárias ao incremento da apicultura objetivou estudar e avaliar a qualidade dos méis comercializados no município de Cuiabá, estado de Mato Grosso.

MATERIAL E MÉTODOS:

Material

As amostras de méis, produzidas por Apis mellifera L., 1758 (Hymenoptera, Apidae) foram adquiridas diretamente no comércio local (feiras, pequenos mercados, farmácias, redes de supermercados e comércio ambulante) do município de Cuiabá, estado de Mato Grosso. Foi realizada a aquisição de 37 marcas de méis provenientes de vários estados sendo: 28 de Mato Grosso, 1 de Minas Gerais, 2 do Paraná, 1 de Rondônia, 2 de São Paulo, 1 de Mato Grosso do Sul, 1 do Piauí e 1 de Pernambuco.

Método

As amostras (Quadro 1) foram encaminhadas ao laboratório do Centro de Estudos Apícolas na sua embalagem comercial original, individual, fechada e intacta com todas as identificações, em número suficiente, representativo às marcas (amostras) de méis comercializados no Município de Cuiabá-MT.

No presente estudo, foram realizadas análises para o parâmetro físico-químico umidade, além das realizadas as analises físico-químicas qualitativas: Reação de Lugol, Reação de Lund e Reação de Fiehe, ficando as análises quantitativa: Sólidos insolúveis e cinzas, restritas àquelas condenadas nos testes qualitativos em cada amostra de mel. As análises foram realizadas no Laboratório do CEA - Centro de Estudos Apícolas da Universidade de Taubaté - São Paulo. Para a realização das análises físico-químicas utilizaram-se metodologias recomendadas pelo Ministério da Agricultura e do Abastecimento - Instrução Normativa (BRASIL, 2000) e de acordo com as normas analíticas do INSTITUTO ADOLFO LUTZ, .

Umidade:

Pela Instrução Normativa n° 11 de 20 de outubro de 2000 do Ministério da Agricultura e Abastecimento (Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade do Mel (Ministério da Agricultura e do Abastecimento), o teor máximo de umidade permitido para méis de flores ou de melato é de 20%. O principio deste método consiste na determinação do índice de refração do mel a 20°C que é convertido para o conteúdo de umidade, através de uma tabela de referência (Chataway) (BRASIL, 2000), (Tabela 4), calculou-se a umidade do mel.

Reação de Lugol.

Esta reação colorimétrica é qualitativa e foi realizada conforme metodologia indicada pelo Instituto Adolfo Lutz. Considera-se positiva quando a coloração final for violeta ou azul. (CANO, et al, 2005). Na presença de glicose comercial ou xaropes de açúcar, a solução ficaria colorida de marrom-avermelhada a azul. A intensidade da cor depende da qualidade e da quantidade

Reação de Lund

Esta reação, baseada na precipitação dos albuminóides do mel pelo ácido tânico, é considerada positiva quando o precipitado variar de 0,6 a 3,0 ml no fundo da proveta e foi realizada conforme metodologia preconizada pelo Instituto Adolfo Lutz. O princípio deste teste de qualidade está na precipitação ácida dos albuminóides. Na presença de mel puro, formar-se-á um depósito de 0,6 a 3,0 ml no fundo da proveta. Em mel artificial ou diluído, não se produz precipitado ou aparecem apenas vestígios.

Reação de Fiehe

A leitura desta prova qualitativa é diretamente ligada à cor vermelha presente na reação do HMF com a resorcina, na presença de glicose comercial ou de mel superaquecido, aparecerá uma coloração vermelha intensa após 5 a 10 minutos, indicando a fraude, foi realizada conforme metodologia preconizada pelo Instituto Adolfo Lutz.

Sólidos insolúveis

Para esta determinação, pesaram-se 20g de cada repetição dos 3 tratamentos utilizados e diluiu-se com a mínima quantidade de água a 80°C transferindo-se para os cadinhos de vidro previamente tarados. Após este procedimento, lavou-se com água destilada à 80ºC até a amostra ficar livre dos açúcares. Colocaram-se os cadinhos em uma estufa a 135°C durante 1 hora e efetuou-se a pesagem logo que esfriaram. Para o cálculo, utilizou-se a fórmula: 100 x N/P=sólidos insolúveis em água g/100 g (N = massa seca de sólidos insolúveis em g, P = massa da amostra em g)

Cinzas

Pegou-se 10 g da amostra em uma cápsula, previamente aquecida em mufla a 550°C, resfriada em dessecador até a temperatura ambiente e pesada. As cinzas devem ficar brancas ou ligeiramente acinzentadas. Em caso contrário, esfrie, adicione 0,5 ml de água, seque e incinere novamente. Resfrie em dessecador até a temperatura ambiente e pese. Repita as operações de aquecimento e resfriamento até peso constante. Para o cálculo, utilizou-se a fórmula:

100 x N / P = cinzas por cento m/m (N = nº de g de cinzas, P = nº de g da amostra)

Tabela


Resultado e discussão

Umidade

A legislação brasileira estabelece que a umidade do mel não deva exceder 20% (BRASIL, 2000). Do total das amostras, o índice de umidade variou de 18,2 a 24,6%, verificando-se que 11 amostras (29,73%) apresentaram umidade superior a 20% , desqualificando-o como mel de mesa.

Reação de Lugol

As 37 amostras analisadas foram submetidas ao teste qualitativo da presença de dextrinas, pelo teste de Lugol apresentando coloração indicativa de adulteração em 6 amostras, registrando um índice de 16,22% de amostras adulteradas. O mel adulterado apresenta reação colorida característica em função da presença de amido e dextrina, o que não ocorre no mel puro.

Reação de Lund

Neste parâmetro foram submetidas à análise somente 31 amostras, representando 83,78% do total das amostras, pois 6 amostras (16,22%), já foram descartadas nos parâmetros anteriores, por se tratar de amostras fora dos padrões estabelecidos pele legislação. A reação de Lund baseia-se na precipitação de substâncias albuminóides naturais pelo ácido tânico. Ela permite a identificação de méis adulterados por adição de xaropes, bem como a detecção de méis artificiais (MENDES, 1983). Os resultados obtidos, não apresentaram adulteração.

Reação de Fiehe

Neste parâmetro foram submetidas à análise somente 31 amostras, representando 83,78% do total das amostras, pois 6 amostras (16,22%) já foram descartadas nos parâmetros anteriores, por se tratar de amostras fora dos padrões estabelecidos pela legislação. Na reação de Fiehe verifica-se a presença de açúcar comercial ou o aquecimento acima de 40°C do produto, formando um composto de coloração vermelha. Das amostras analisadas, 6 amostras (19,35%), apresentaram resultados positivos nesta prova, tal resultado sugere a adulteração do mel pela adição de glicose ou ainda superaquecimento do produto.

Sólidos insolúveis

Neste parâmetro foram submetidas à análise somente 24 amostras, representando 64,86% do total das amostras, pois 13 amostras (35,14%) já foram descartadas nos parâmetros anteriores, por se tratar de amostras fora dos padrões estabelecidos pela legislação. Os resultados das análises mostram que os teores de sólidos insolúveis obtiveram 79,17% de reprovação, estando com seu valor bastante acima do limite exigido pela legislação, ficando fora dos padrões de exigidos pela legislação que é de 0,1% (BRASIL, 2000).

Cinzas

Neste parâmetro, foram submetidas à análise somente 5 amostras, representando 13,51% do total das amostras, pois 32 amostras (86,49%) já foram descartadas nos parâmetros anteriores, por se tratar de amostras fora dos padrões. Pelos valores obtidos, uma amostra apresentou 3,19% de cinzas, acima dos padrões, representando 20% das amostras analisadas. A legislação brasileira estabeleceu que o limite máximo de cinzas presentes no mel deve ser de 0,6% para mel floral e até 1,2% para mel de melato (BRASIL, 2000).

CONCLUSÕES:

Dentre as trinta e sete amostras analisadas, apenas quatro (10,81%) amostras de méis comercializadas no Município de Cuiabá, Estado de Mato Grosso, considerando os parâmetros físico-quimicos, apresentaram-se dentro dos padrões estabelecido pelo Ministério da Agricultura e Abastecimento, como mel apto para o consumo de mesa, com um índice de reprovação de trinta e três (89,19%) amostras de méis;

16,21% foram consideradas fraudadas e/ou adulteradas por meio à adição de amido de milho;

18,91% podem ser consideradas fraudadas ou submetidas à altas temperaturas durante o armazenamento. Sugere-se a realização de análises complementares para a detecção de possível fraude;

Dentre as amostras reprovadas, 4 apresentavam algum tipo de Registro de Fiscalização, entre eles o Serviço de Inspeção Federal;

Grande parte das amostras foram reprovadas pelos parâmetros de sólidos insolúveis, umidade e cinzas, o que revela falta de aprimoramento técnico dos apicultores nos processos de colheita, extração e beneficiamento do mel.

Referência Bibliográficas

BRASIL. Instrução Normativa n° 11, de 20 de Outubro de 2000. Estabelece regulamento técnico de identidade e qualidade do mel. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 23 out. 2000. Seção 1, p. 16-17.

CANO, C. B.; NAGATO, L. A. F.; DURAN, M. C. colab. Açúcares e produtos correlatos. In: INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Métodos físico-químicos para análise de alimentos. 4º ed. Brasília: ANVISA, 2005. cap. 7, p. 321- 343.

IBGE. Pesquisa Pecuária Municipal - 2006. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/ Acesso: 29 out. 2008.

INSTITUTO ADOLFO LUTZ, SÃO PAULO. Normas analíticas do Instituto Adolfo Lutz: métodos químicos e físicos para análise de alimentos. V.1; 3 ed; São Paulo, 1985

MONTES, A. R. Apicultura. Diponível em Artigo acessado em 11 set. 2007.

MENDES. B. A.; COELHO, E. M. Considerações sobre as características do mel de abelhas: análises e critérios de inspeção. Informe Agropecuário, Belo Horizonte-MG., v.9, p.106, 1983.

RESENDE, R. B. A contribuição da Rede Apis na implantação da apicultura sustentável. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE APICULTURA, 17., 2008, Belo Horizonte-MG. Anais XVII Congresso Brasileiro de Apicultura: Confederação Brasileira de apicultura, 2008. [CD ROM].

VARGAS, T. Avaliação da Qualidade do mel produzido na região dos Campos Gerais da Paraná. 2006. 148f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Estadual de Ponta Grossa, Ponta Grossa.

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