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MANUTENÇÃO E DIVISÃO DE COLÔNIAS DE ABELHAS MELIPONINI COM NINHOS SUBTERRÂNEOS MANTIDAS EM CAIXAS RACIONAIS

Autores: Cristiano Menezes; Sidnei Mateus; Vera Lucia Imperatriz Fonseca Instituição: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo - Correspondência: menezes.cristiano@gmail.com

As abelhas sem ferrão que fazem ninhos subterrâneos usando cavidades pré-existentes possuem algumas características bastante peculiares em relação às espécies que fazem seus ninhos em ocos de árvores. Por exemplo, geralmente elas não jogam lixo para fora da colônia, armazenando-o no fundo da cavidade onde nidificam; constroem sua saída voltada para cima usando um túnel de diâmetro e comprimento variável dependendo da espécie e não lateral como ocorre nas outras abelhas sem ferrão; são mais sensíveis às variações de temperatura do ambiente. Essas características dificultam seu manejo e manutenção em caixas racionais tradicionais. Escrevemos o presente relato com o intuito de dar algumas dicas sobre a manutenção e divisão dessas abelhas subterrâneas, baseadas em alguns testes preliminares que nós fizemos.

Há cerca de um ano e seis meses, recebemos em Ribeirão Preto uma colônia de Geotrigona mombuca, conhecida popularmente como mombuca. Inicialmente a mantivemos na mesma caixa de origem, que era uma caixa simples (30x30x30cm) e com madeira bem fina (5 mm). Mantivemos a colônia dentro do laboratório e com abertura lateral na parte inferior da caixa, conectada ao ambiente por meio de uma mangueira que atravessava a parede (aproximadamente 30 cm).

Notamos que o acúmulo de lixo no fundo da caixa era muito grande e isso estava atraindo muitos parasitas (forídeos, ácaros, pequenas formigas). Além disso, as operárias demoraram muito a começar a forragear e para entrar no tubo de entrada, que ficava na parede do laboratório. Do lado de fora do laboratório, logo embaixo de onde ficava a entrada, observamos um acúmulo grande de folhas miúdas e pedacinhos de gravetos. Quando o inverno começou, a condição da colônia agravou-se ainda mais. Diante da situação, a transferimos para uma caixa racional tradicional e iniciamos alguns testes preliminares, com algumas alterações na sua organização interna, adequando às características das abelhas subterrâneas (Figura 1).

No fundo da caixa, colocamos uma alça especialmente para o depósito de lixo, o que já é utilizado por alguns meliponicultores em outras espécies tradicionalmente criadas. Isso facilitou o nosso trabalho de limpeza do lixo delas, uma vez a cada dois meses podemos remover todo o lixo sem muito distúrbio. Eventualmente elas constroem potes de mel e pólen neste local, mas eles podem ser facilmente transferidos para a parte superior.

Uma outra opção, já testada em outras espécies de abelhas subterrâneas, inclusive com mamangavas de chão, é colocar uma tela no fundo da caixa (substituindo o fundo de madeira) e colocar a caixa sobre um recipiente com terra (Figura 1). A terra ajuda na absorção do lixo e pode ser facilmente renovada.

Do lado de fora do laboratório, nós colocamos uma caixa de madeira com terra de modo que a mangueira da entrada passa por baixo da caixa e sai pela terra (Figura 2). Em pouco tempo a atividade das operárias aumentou bastante, elas construíram um tubinho de cerume e depositaram uma enorme quantidade de folhinhas e gravetos ao redor da entrada que provavelmente ajuda na localização da entrada do ninho (Figuras 3 e 4).

Para resolver o problema do frio durante o inverno, usamos um aquecedor simples, feito com uma caixinha de isopor e uma lâmpada de 7 W, que era colocado debaixo da caixa. A lâmpada era conectada em um temporizador que a mantinha ligada somente durante a noite. Se não for possível usar aquecedor, aconselhamos que proteja a colméia com isopor grosso, tanto na parte inferior, como nas laterais. Durante as outras estações não é necessário utilizar aquecedores.

Poucas semanas após o fim do inverno a colônia já estava muito forte e foi dividida duas vezes com sucesso nos seis meses seguintes. Usamos os métodos tradicionais para divisão da colônia, passando uma alça com a cria velha e pelo menos uma célula real para uma caixa vazia. As filhas foram colocadas em caixas semelhantes, mas em ambiente aberto (Figura 5). A princípio tentamos usar o mesmo método usado na colônia que estava no laboratório, com uma mangueira lateral passando por baixo de uma caixinha com terra. Porém, elas não estavam saindo. Por isso, ao invés de uma mangueira lateral, colocamos a caixa com terra sobre a tampa com uma pequena mangueira passando pela parte superior da caixa. No dia seguinte elas já estavam saindo normalmente pela mangueira (Figura 6).

Por que criar abelhas subterrâneas? Primeiramente, por causa da sua importância ecológica, pois também são polinizadoras de muitas plantas nativas e possivelmente de plantas cultivadas. Segundo, porque elas são tão interessantes quanto às outras abelhas sem ferrão. Terceiro, porque não é fácil cavar 2 metros de profundidade para retirar uma colônia (é muito mais fácil dividir uma!). Quarto, porque são bastante produtivas se forem manejadas de forma adequada (Figura 7 e 8).

E quinto, porque elas possuem o mel mais excepcional que já experimentamos, semelhante ao mel das Meliponas, mas com sabor semelhante a limão.


Figura 1: Modelo de caixa racional para abelhas sem ferrão subterrâneas.

Figura 2: Caixinha com terra do lado de fora do laboratório, por onde passa a mangueira de entrada da colônia que fica dentro do laboratório. No centro da caixinha é possível notar o tubo de entrada que as operárias construíram com cerume.

Figura 3 e 4: Detalhe dos tubos de entrada construídos pelas operárias com cerume. Espécie: Geotrigona mombuca, conhecida como guira, guiruçu ou iruçu mineiro.

Figura 5: Modelo de colméia utilizado em ambiente aberto para abelhas subterrâneas. Note que a alça superior é preenchida com terra e há uma mangueira que dá acesso ao ninho.

Figura 6: Detalhe do tubo de entrada e da abelha. Note os detritos depositados ao redor da entrada, são folhas pequenas, sementes e gravetos. Dependendo da mangueira utilizada, é aconselhável dar um banho de cera no interior da mangueira para as abelhas não escorregarem.

Figura 7: Organização interna da colônia de Geotrigona mombuca, com favos de cria novos em formato espiral na região central e potes de mel e pólen na periferia. É interessante mencionar que o ninho fica suspenso, preso apenas nas laterais da caixa. É muito importante lembrar-se disso quando for manejar essas abelhas.

Figura 8: Potes de mel. O formato do pote nessa espécie é diferente do formato tradicional, pois é alongado, semelhante a um cilindro.


AGRADECIMENTOS

Agradecemos aos nossos companheiros dos laboratórios de abelhas de Ribeirão Preto e São Paulo pelos comentários, sempre muito bem vindos. Agradecemos também à FAPESP pelos auxílios à pesquisa (04/15801-0 e 07/50218-1)

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