Artigo

OCORRÊNCIA DE LARVAS DE Leptus sp. LATREILLE 1796 (ACARINA: ERYTHRAEIDAE) EM OPERÁRIAS DE ABELHAS AFRICANIZADAS A. mellifera LINNAEUS 1758 (HYMENOPTERA: APIDAE), NO BRASIL1

Érica Weinstein Teixeira2 1Recebido para publicação em 03/11/08. Aceito para publicação em 05/12/08.
B. Indústr.anim., N. Odessa,v.65, n.3, p.249-251, jul./set. 2008 2Pólo Regional de Desenvolvimento Tecnológico dos Agronegócios do Vale do Paraíba (PRDTA-VP), Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA), Av. Professor Manoel César Ribeiro, 1920, Bairro Santa Cecília, Caixa postal 7, CEP 12400-970, Pindamonhangaba, SP, Brasil. E-mail: erica@apta.sp.gov.br

RESUMO

Este trabalho representa o primeiro registro da ocorrência de larvas de Leptus sp. Latreille 1796 (Acarina: Erythraeidae) em operárias de abelhas africanizadas A. mellifera Linnaeu 1758 (Hymenoptera: Apidae), no Brasil, com base em observações de infestação, em três anos consecutivos, no final do inverno, em apiários localizados no município de São José dos Campos, São Paulo. Os exemplares de Leptus sp. encontravam-se aderidos ao corpo das abelhas campeiras que chegavam ao alvado das colméias e a área de fixação preferida pelas larvas do ácaro foram tórax e cabeça das abelhas campeiras, muito embora tenham sido observadas também larvas aderidas a diferentes segmentos do abdômen e pernas do inseto.

Palavras-chave: abelhas melíferas, ácaro, parasitismo, Leptus.

REPORT ON THE OCCURRENCE OF Leptus SP. LATREILLE 1796 (Acarina: Erythraeidae) ON AFRICANIZED HONEY BEES A. mellifera LINNAEUS 1758 (Hymenoptera: Apidae) WORKERS, IN BRAZIL

ABSTRACT: This study represents the first record of the occurrence, in Brazil, of larvae of Leptus sp. Latreille 1796 (Acarina: Erythraeidae) in workers of Africanized honey bees A. mellifera Linnaeus 1758 (Hymenoptera: Apidae). The observations were done in three consecutive years, at the end of Winter, in apiaries located in the city of São José dos Campos, São Paulo. Specimens of Leptus sp. were found attached to the body of bees that were reaching the entrance of the hives and the area of fixation preferred by the larvae of the mite were thorax and head of workers bees, even so have been also observed adhered larvae at the different segments of the abdomen and legs of the insect.

Key words: honey bees, mite, parasitism, Leptus

Muito embora o parasitismo de ácaros em insetos seja conhecido desde há muito tempo, ainda hoje pouco se sabe sobre o efeito real destes sobre os insetos que atacam (FLECHTMANN e MORAES, 1996). Diversos ácaros associados a abelhas melíferas já foram identificados (DE JONG et al., 1982) e resultam em relações que variam do comensalismo ao endo e ectoparasitismo (FLECHTMANN, 1980).

Dentre os gêneros da família Erythraeidae, pertencente à subordem Prostigmata, apenas um ocorre em abelhas, o gênero Leptus (O.CONOR e KLIMOV, 2003).

A despeito das 90 espécies já identificadas pertencentes a esse gênero (BAKER e SELDEN, 1997), até o momento apenas Leptus ariel foi confirmada e descrita em Apis mellifera, com ocorrência na Guatemala (SOUTHCOTT, 1989), além de outras duas espécies não identificadas (possivelmente a mesma espécie), com ocorrências descritas previamente na Colômbia (LOSADA, 1947) e no Peru (FLECHTMANN, 1980). Tão exíguas constatações comprovam afirmações de DE JONG et al. (1982), que descreveram como sendo muito raras as associações entre ácaros da família Erythraeidae e abelhas melíferas.

Este trabalho tem por objetivo registrar a primeira evidência da ocorrência de larvas de Leptus sp.em operárias de abelhas A. mellifera africanizadas, no Brasil

A infestação foi constatada em dois apiários localizados no município de São José dos Campos (23º12'23"S, 45º58'11"W), São Paulo, Brasil, no final do inverno de três anos consecutivos (2006, 2007 e 2008).

Aproximadamente 50% das colméias em produção de pólen de cada apiário foram acometidas, totalizando 40 colméias com considerável grau de infestação. Cerca de 50 larvas do ácaro, as quais se encontravam aderidas ao corpo das abelhas campeiras que chegavam ao alvado das colméias foram coletadas e submetidas à identificação taxonômica por especialista.

Saliente-se que a freqüência observada de larvas de ácaros por abelha era de três a cinco indivíduos, chegando, no entanto, até 20. Constatou-se a fixação das larvas do ácaro preferencialmente no tórax e na cabeça das abelhas campeiras, muito embora tenham sido observadas também larvas em diferentes segmentos do abdômen e pernas do inseto (Figuras 1 e 2). No tórax, o propódeo foi a região de maior freqüência. As larvas ingurgitadas apresentavam coloração vermelho-alaranjada (Figuras 1 e 2).

Não foram observados ácaros adultos nas crias de abelhas, e isso leva alguns especialistas a acreditarem que a propagação ocorra fora da colméia, ocorrendo a infestação inicial durante o forrageamento para coleta de pólen e néctar, ou mesmo no simples contato com o solo úmido, em busca de água (O.CONOR e KLIMOV, 2003). Embora alguns estudiosos admitam a relação interespecífica e harmônica de foresia entre ácaros e abelhas (EICKWORT, 1997), na ocorrência ora descrita trata-se de parasitismo, pois larvas do ácaro em vários estágios de ingurgitamento foram coletadas.

FLECHTMANN (1980), ao descrever detalhadamente os diferentes estágios de desenvolvimento (ovo, pré larva, larva, protoninfa, deutoninfa, tritoninfa e adulto) do ácaro (gênero Leptus e família Erythraeidae, em geral), evidenciou as principais características da fase larval, as quais estão de acordo com as observações ora obtidas: .inicialmente pequena, quase imperceptível, de cor amarelada, a larva ingurgita, aumentando várias vezes de volume e passando a exibir uma coloração vermelho alaranjado,viva. Nesse estágio é facilmente visível como um pequeno .saco. vermelho aderente ao abdômen da abelha. O ingurgitamento leva tempo bastante variável (quatro ou cinco semanas). Completamente ingurgitada, abandona a abelha, procurando um lugar abrigado e transforma-se em protoninfa.. Saliente-se que a idade inicial e final das abelhas ao realizarem atividades de coleta no campo é bastante variável, porém, freqüentemente, com duração inferior a três semanas (SAKAGAMI, 1953,FREE, 1980).

Não foi possível encontrar ácaros nas fases ninfais e adulta (octópode, de vida livre). O relato por parte do produtor envolvido, de cerca de 20% de mortalidade de abelhas adultas em seus apiários no período, não pôde ser conclusivamente relacionado com a infestação do ácaro, visto que não foram observados ácaros aderidos às abelhas adultas mortas coletadas na frente do alvado. Eventuais alterações do metabolismo das abelhas acometidas não foram averiguadas, todavia SOUTHCOTT (1961) e FLECHTMANN (1980) descreveram tal larva como parasita, a qual ao injetar suco digestivo produz no corpo do hospedeiro um sistema de tubos ramificados (estilóstoma), resultante da interação da secreção salivar da larva com componentes do corpo do hospedeiro.

Estudos mais detalhados, que visem avaliar a relação de tais ácaros com A. mellifera, devem ser conduzidos.


Figuras 1 e 2. Larvas do ácaro Leptus sp., ingurgitadas e de coloração vermelho-alaranjada, encontradas em operárias de abelhas A. mellifera africanizadas. 1 . Larvas de Leptus sp. fixadas em diferentes segmentos do corpo da abelha (cabeça, tórax e abdômen). 2 . Aglomerado de larvas de Leptus sp. indicado pela seta, no propódeo de abelha campeira (observado em microscópio estereoscópico, aumento 20x)


AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Carlos H. W. Flechtmann (Pesquisador do CNPq, USP/ESALQ), pela identificação do ácaro, bem como leitura crítica do manuscrito; ao Prof. Dejair Message (UFV) pela assistência e conselhos durante a elaboração do trabalho; ao Biólogo e Apicultor Luiz Antônio (Ser Apis . Incubadora Tecnológica), pelas observações de campo e coleta de abelhas campeiras parasitadas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKER, A. S.; SELDEN, P. A. New morphological and host data for the ectoparasitic larva of Leptus hidakai Kawashima (Acari, Acariformes, Erythraeidae). Sistematic Parasitology, v.36, p.183 -191, 1997.

De JONG, D.; MORSE, R. A.; EICKWORT, G. C. Mite pests of honey bees. Annual Review of Entomology, v. 27, p. 229-252, 1982.

EICKWORT, G. C. Mites: an overview. In: MORSE, R. A.; FLOTTUM. Honey bee pests, predators and diseases.(Eds). 3 ed. Medina: Root Company, 1997. p. 239-250.

FLECHTMANN, C. H. W. Dois ácaros associados à abelha (A. mellifera L.) no Peru. Anais da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, v. 37, p.737-741, 1980.

FLECHTMANN, C. H. H.; MORAES, G. J. 1996. Estudo da diversidade de ácaros do Estado de São Paulo.. http://www.biota.org.br/info/historico/workshop/revisoes/acaros.pdf (Acesso em 15. out.. 2008).

FREE, J. B. A organização social das abelhas (Apis). São Paulo: Ed. Pedagógica e Universitária Ltda,1980. 79 p.

LOSADA, B. S. Nuevas especies para Colombia: localizadas por primera vez por la Seccion de Entomologia. Revista Facultad Nacional Agronomia, v.7, n. 27, p. 325-332, 1947.

O.CONNOR, B.; KLIMOV, P. Family Erythraeidae Robineau-Desvoidy, 1828. 2003. http://insects.ummz.lsa.umich.edu/beemites/Species_Accounts/Erythraeidae.htm. (Acesso em 12. set. 2008).

SAKAGAMI, S. F. Untersuchungen über die Arbeitsteilung im einem Zwergvolk der Honigbiene. Beiträge zur Biologie des Bienenvolkes, Apis mellifica L. Japanese Journal of Zoology, v. 11, p.117-185,1953.

SOUTHCOTT, R. V. Studies on the systematic and biology of the Erythraeoidea (Acarina), with critical revision of the genera and subfamilies. Australian Journal of Zoology, v. 9, n.3, p. 367-611, 1961.

SOUTHCOTT, R. V. A larval mite (Acarina: Erythraeidae) parasitizing the European honey bee in Guatemala. Acarologia, v.30, n.2, p.123-129, 1989.

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