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IMPRESSÕES SOBRE O CONGRESSO INTERNACIONAL DE APICULTURA DA APIMONDIA 2007 EM MELBOURNE-AUSTRALIA

Lionel Segui Gonçalves -Prof. Titular da FFCLRP-USP de Ribeirão Preto-SP e Presidente da Comissão de Coordenação Técnico-Científica da Confederação Brasileira de Apicultura (E-mail:lsgoncal@usp.br)

Considerações gerais sobre o Congresso da Apimondia na Austrália, a candidatura do Brasil para sede do Congresso em 2011 e a participação oficial do Brasil nas reuniões da Apimondia em Melbourne em 2007.

Figura 1 - Vista geral da cidade de Melbourne,Austrália,
próximo ao Centro de Convenções onde
se realizou o Congresso da Apimondia 2007

O Congresso da Apimondia em 2007 foi realizado na cidade de Melbourne, Austrália, cuja população oscila ao redor de 3,5 milhões de habitantes .A cidade de Melbourne foi fundada em 1835, é banhada pelo rio Yarra, sendo a segunda mais importante cidade da Austrália, já tendo sido sua capital de 1901 a 1927 quando a capital passou a ser Canberra. Melbourne é conhecida como a capital esportiva e cultural da Austrália, sendo frequentemente escolhida para eventos esportivos e culturais, apresentando um excelente Centro de Convenções, local onde se realizou o Congresso da Apimondia.

Foram discutidos ao redor de duas centenas de trabalhos técnico-científicos na forma de conferencias, mesas redondas, simpósios, apresentações orais e posters apresentados por pesquisadores, técnicos e apicultores representantes de aproximadamente 50 países e com a participação de mais de 2.000 inscritos.

No final do Congresso houve uma excursão técnico-científica nos arredores da cidade de Melbourne onde foram visitadas empresas apícolas de médio porte, bem como instalações contendo maquinários e veículos modernos apropriados para a exploração apícola de larga escala.

Na API-EXPO 2007 havia ao redor de 100 expositores de inúmeros países membros da Apimondia, com rica exposição de equipamentos e produtos apícolas trazidos de várias regiões do mundo, com destaque principalmente para os países asiáticos que se encontravam mais próximos à Austrália e Nova Zelândia. Poucos países vieram da América do Sul e Central, porém o Brasil se fez representar por um Stand da Confederação Brasileira da Apicultura, tendo participado com uma reduzida delegação liderada pelo Presidente da Confederação Brasileira de Apicultura, Sr. José Gumercindo Cunha , Silvana Gomes representante do Bureau de Convenções de Salvador-Ba., Flavia Malkine, representante da Embratur de Brasília-DF, da Profa. Dra. Kátia P. Gramacho de Salvador-Ba e de minha pessoa como Presidente da Comissão de Coordenação Técnico-científica da CBA. O modesto Stand do Brasil, bem como a pequena delegação deveu-se a escassez de recursos obtidos pela CBA e, principalmente, a falta absoluta de apoio institucional por parte do Governo da Bahia.

Figura 2 - Vista do stand da Confederação
Brasileira de Apicultura na
APIEXPO 2007 vendo-se,da direita
para a esquerda o Prof.Dr. Lionel
S.Gonçalves e senhora e Silvana Gomes,
representante do Convention Bureau
de Salvador na comitiva da CBA.

Por proposta oficial e documentada de um diretor do Sebrae da Bahia, foi oferecida a cidade de Salvador para sediar o Congresso Mundial de Apicultura da Apimondia em 2011, o que foi aprovado em Assembléia Geral da CBA. No entanto, o Governo do Estado da Bahia, após ter se comprometido perante autoridades da APIMONDIA e da Confederação Brasileira de Apicultura, em audiência oficial em Salvador, em Julho de 2007, ocasião em que foram oferecido recursos para a delegação brasileira ,infelizmente não honrou o compromisso, fato que causou muitas dificuldades e constrangimentos para a CBA. Devido a isso a delegação brasileira contou de fato apenas com o apoio organizacional do Bureau de Convenções de Salvador e recursos da Fundação Banco do Brasil e da Embratur, apoios esses que, embora reconhecidamente fundamentais para garantir os custos mínimos de deslocamento da reduzida delegação brasileira, infelizmente não foram suficientes para custear, à altura, a programação feita pela CBA. Independente da necessidade de recursos, muito antes do Congresso a delegação brasileira já estava ciente das dificuldades de competir com a Argentina que competia pela terceira vez para sediar o Congresso da Apimondia e o México, importante exportador mundial de mel.. A Argentina,além da experiência das competições anteriores e significativa representação oficial e institucional, tinha como um dos representantes de sua comitiva oficial o próprio Vice-Presidente da Apimondia que é argentino, o que não tira o grande mérito dos argentinos na missão vitoriosa que tiveram. O insucesso da delegação brasileira quanto ao objetivo de trazer para Salvador o congresso da Apimondia atribuo principalmente à absoluta falta de apoio do Governo baiano, ao atraso na liberação de recursos das duas entidades governamentais que apoiaram o evento e à falta de experiência da empresa contratada pela CBA para organizar a proposta brasileira que nos causou grande constrangimento pois, o CD preparado em Salvador e apresentado em Melbourne foi elaborado de última hora, foi fraco politicamente , absolutamente incompleto do ponto de vista apícola e parcial do ponto de vista turístico brasileiro, uma vez que apresentou apenas cenas de Salvador.

Além disso, entre outros problemas que nos causaram dificuldades destaco um importante, a compra do stand da CBA que, devido aos problemas financeiros e por ter sido efetuado o pagamento de última hora, o local alocado ficou fora do salão principal da API-EXPO 2007. (95 % dos stands da Feira estavam instaladas no 3º. Andar do Centro de Convenções e não mais de cinco stands,inclusive o do Brasil, ficaram no 2º. Andar, totalmente isolados do grande público). Devido às dificuldades financeiras já citadas também não foi possível a colaboração nem a participação de nenhuma empresa apícola brasileira no stand da CBA, ficando o stand brasileiro totalmente desprovido de produtos e equipamentos apícolas brasileiros. Infelizmente não pudemos mostrar nem negociar a grande diversidade de produtos apícolas que temos, nem mostrar a grande riqueza que hoje representa a indústria apícola brasileira que fabrica de fumegadores às mais modernas centrífugas e desoperculadoras com controle eletrônico, já premiadas em Apimondias anteriores das quais participamos. Não havia um único frasco de mel para expor no stand da CBA no Congresso de Melbourne e tivemos que nos limitar a apresentar apenas cartazes e folders da Bahia, além de Posters técnico-científicos improvisados por nós, com recursos próprios, para que tivéssemos pelo menos informações sobre a apicultura brasileira e seu progresso nos últimos anos. Portanto, devido a esses fatos houve baixa freqüência de público no local do stand da CBA em comparação com os demais locais, apesar do esforço de toda a comitiva brasileira.

Figura 3 - Prof. Dr. Lionel S. Gonçalves, da USP
(Ribeirão Preto) apresentando um de seus trabalhos
( De Jong, Gonçalves & Fracoy ) na APIMONDIA 2007,
sobre o efeito da cor da tela da máscara do apicultor
na agressividade das abelhas africanizadas.

Por outro lado, como a Argentina participava pela terceira vez na competição para sediar o evento, pelo fato ter apresentado a melhor campanha e, diferentemente do Brasil, por apresentar significativo apoio institucional e político, merecidamente, em nossa opinião, foi escolhida para sediar do Congresso da Apimondia de 2011, em Buenos Aires. Gostaria porém de afirmar que, independente do problema da campanha para sediar o congresso da Apimondia, o Brasil se fez representar dignamente, tanto em número como em nível de trabalhos técnico-científicos apresentados por vários pesquisadores brasileiros.

Quanto à representatividade brasileira no Congresso, independente da CBA tive também minha participação oficial na Apimondia como membro titular da Comissão Permanente de Biologia da Apimondia. Também durante o Congresso da Apimondia o Brasil se fez representar na reunião do Comite Internacional Latinoiberoamericano de Apicultura pela minha pessoa como membro fundador do referido Comitê ocorrido no último Congresso Latinoiberoamericano de Apicultura realizado na Espanha em 2005 e pelo atual Presidente da CBA, Sr. José Gumercindo Cunha e Profa.Dra. Katia P. Gramacho como membro do comitê científico, por indicação do Presidente Cunha. Ainda na parte técnica o Brasil se fez representar no Concurso de Produtos Apícolas da Apimondia, por iniciativa privada da empresa brasileira de Araranguá-SC, Apis Nativa Produtos Naturais Ind. Com. Ltda, cujo atual nome fantasia é Prodapys, tendo obtido uma medalha de ouro pelo melhor mel escuro e medalha de prata no concurso de cera.

Finalmente devo ressaltar o grande empenho e profunda dedicação do Presidente da CBA, Sr. José Gumercindo Cunha no sentido de que a delegação brasileira tivesse o apoio necessário para sua representação oficial na Apimondia da Austrália, não medindo esforços para o sucesso da missão, antes e durante o evento, em todos os aspectos envolvidos. Com base nos fatos aqui relatados e pela seriedade do Presidente Cunha, em todos os atos que presenciei, na minha opinião considero que a CBA saiu-se vitoriosa dessa difícil empreitada, pelo trabalho sério que realizou, apesar da falta de recursos e apôio institucional.

Figura 4 - Comitiva oficial da CBA no momento da
apresentação da proposta brasileira para sediar o Congresso
da Apimondia, vendo-se a Sra. Silvana Gomes
(Convention Bureau de Salvador), a Sra. Flavia Malkine
(Embratur) a Profa.Dra. Katia P.Gramacho e Prof.
Dr.Lionel S.Gonçalves (Comissão Técnico Científica da CBA)
e o Presidente da CBA, Sr. José Gumercindo da Cunha.

Devo lembrar a todos que, após o Congresso da Apimondia no Rio de Janeiro, em 1989, este foi o primeiro congresso em que o Brasil se fez representar na Apimondia com um stand da CBA e com uma delegação liderada pelo seu próprio presidente. Assim, face aos fatos aqui comentados, considero o Presidente Cunha como merecedor de todo o meu apôio, admiração e respeito, finalmente cumprimentando-o pela sua dedicação e empenho em prol da apicultura brasileira.

Trabalhos técnico-científicos apresentados na Apimondia

O Congresso da Apimondia teve como ponto de maior destaque os trabalhos nas áreas de biologia e de patologia apícola. Quanto à patologia houve muita expectativa sobre os resultados das análises feitas nos Estados Unidos bem como na Europa sobre o problema do desaparecimento em massa das abelhas (Distúrbio do Colapso das Colônias ou CCD) tanto nos Estados Unidos como em alguns países da Europa e cujas causas são motivos de muita polêmica em todo o mundo. Foram apontadas várias causas para o desaparecimento das abelhas ( Colony Collapse Disorder ou simplesmente CCD )destacando-se como principais o protozoário Nosema ceranae, o ácaro Varroa destructor, ausência de pólem em algumas regiões, plantas transgênicas, manejo, agrotóxicos, o vírus IAPV (Israeli Acute Paralysis Vírus ) etc.

No entanto, não houve um posicionamento oficial com causa única, sendo a mortalidade atribuída a vários fatores em conjunto. Houve inclusive a manifestação de um cientista americano Dr. Robert E. Page Jr. segundo o qual há um certo exagero e engano nas estatísticas divulgadas, sendo de opinião que deve haver mais cautela nas análises dos dados dos pequenos apicultores, uma vez que não se obteve até agora provas claras do desaparecimento em massa entre os apicultores comerciais de maior porte nos Estados Unidos.

Figura 5 - Mesa redonda sobre Patologia Apícola vendo-se
o Dr. W. Ritter (Alemanha) e uma projeção sobre
as hipóteses do grupo de estudos sobre as possíveis
causas do desaparecimento das abelhas

Segundo o Dr, Page muitas vezes ocorre à morte de abelhas por simples falta de manejo apropriado ou devido a outros fatores como pesticidas, desnutrição, etc. Tem sido muito divulgado o protozoário Nosema ceranae como um dos principais agente causadores do CCD. Mais recentemente tem sido apontado o agente viral (IAPV) como causador da doença e que teve origem na Austrália. O IAPV foi primeiro descrito em 2004, em Israel, onde abelhas infectadas apresentavam defeitos nas asas seguido por paralisia,ocorrendo a morte das abelhas fora das colméias.A importação de abelhas da Austrália pelos Estados Unidos deu-se a partir de 2004, quando iniciaram os relatos sobre o enfraquecimento das colméias. Esse vírus foi encontrado inclusive em colméias não classificadas como possuindo CCD, o que poderia indicar uma variação de linhagens, co-infecção ou presença de fatores causadores de stress como pesticidas ou desnutrição.Como se sabe, a varroa suprime imunologicamente as abelhas, tornando-as mais susceptíveis a outras doenças e a entrada de vírus.

Como o vírus IAPV é transmitido pelo ácaro varroa e foi encontrado em amostras de abelhas vindas da Austrália, embora não exista varroatose na Austrália, resta saber se esse vírus que é um significante marcador de CCD, pode sozinho ou associado a outros fatores causar o desaparecimento das abelhas, o que precisa ainda ser devidamente comprovado.

Figura 6 - Vista parcial de uma das apresentações
de um Grupo Musical Brasileiro contratado
pela Embratur para a APIEXPO 2007, com dançarinas,
demonstração de capoeira e uma baiana com trajes
típicos, vendo-se o Presidente Cunha vestindo a
camisa brasileira no sentido amplo da palavra.

Portanto, de certa forma foi decepcionante para os congressistas em geral a falta de conclusões claras ou mesmo de orientações dos especialistas sobre as causas do desaparecimento das abelhas, ficando os apicultores ainda sem uma orientação clara do que fazer. Por outro lado, destaco uma notícia interessante sobre um possível combate ao protozoário Nosema ceranae, considerado como um dos principais agentes causadores da CCD, um novo produto (Apiherb) usado recentemente na Itália com ação especifica contra este protozoário, porém ainda em fase de testes e cujo resumo será comentado a seguir, juntamente com outros resumos de trabalhos apresentados no Congresso.

Figura 7 - "Mel ativo de Manuka" exposto em vários stands
da API-EXPO 2007, coletado de plantas arbustivas
existentes unicamente na Nova Zelândia
(Leptospermum scoparium) e na Australia
( Leptospermum polygalifolium) e que possuem o fator
UMF (Unique Manuka Factor) de ricas propriedades
biológicas e medicinais.

Na API-EXPO 2007 aproximadamente 100 expositores apresentaram seus produtos apícolas e equipamentos que permitiram aos participantes do congresso não apenas realizarem transações comerciais e intercâmbios de informações como uma atualização dos conhecimentos. Em relação aos produtos das abelhas não podemos deixar de destacar e de comentar a presença, em vários stands, do famoso "Mel Manuka", de ricas e comprovadas propriedades medicinais e que é encontrado em plantas arbustivas encontradas apenas na Nova Zelândia ( Leptospermum scoparium ) e na Austrália (Leptospermum polygalifolium ).

Sabe-se que a maioria das ações antibacterianas do mel provém do peróxido de hidrogênio, que é produzido por uma enzima chamada de glucose oxidase, porém que é inativada pela luz e calor. Portanto, embora todos os méis sejam antibacterianos e anti-sépticos, o Mel ativo de Manuka apresenta atividades biológicas e medicinais adicionais devido a presença do fator UMF (Unique Manuka Factor) não encontrado em outros méis, fator que é estável ao calor, luz e enzimas.Esta propriedade foi descoberta pelo pesquisador Dr. Peter Molan, da Universidade de Waikato, na Nova Zelândia, tendo já sido comprovada a eficiência medicinal desse mel por vários laboratórios da Nova Zelândia e da Austrália, para matar bactérias e fungos encontrados em feridas, úlceras estomacais etc. Foram publicados 409 Resumos nos Anais do congresso (Apimondia Programme & Abstracts Beekeeping Down Under, September 9th to 14th 2007, 230pg ) sendo que aproximadamente 200 foram apresentados na forma oral ou de posters.

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