Nota

Uma viagem pelo intestino da abelha.

Bruno Porlier
Com a autorização amável de: Revista GACETA DEL COLMENAR (S.A.D.A)
Realização: Nadia Rivas - ApiAmerica 2004

Bruno Porlier desenvolve nesta nota o tema sobre uma função vital para a abelha: a digestão. Chega a isto a partir de um aspecto da biologia da abelha que tanto interessa para os apicultores, pois o tubo digestivo é a parte onde se elabora o precioso mel, objeto de toda nossa atividade.

Antes de abordar a função propriamente dita, vamos nos deter um momento na estrutura da boca da abelha. Porque, embora seja interessante saber o que acontece com as matérias ingeridas pelo inseto, também é interessante saber como eles chegaram até a vesícula melífera. Se pensa que originalmente, os insetos que viveram várias centenas de milhões de anos atrás eram animais carnívoro ou fitófagos. Em função disto, eles deveriam possuir um aparato bucal de tipo "mastigador", caracterizado por peças curtas e robustas, recobertas por uma cutícula grossa. Nossos grilos atuais ou baratas, insetos primitivos do ponto de vista evolutivo, são um exemplo bom de que deveria ter sido no princípio estes apêndices. Logo novas famílias de insetos apareceram e eles tiveram que se adaptar a novos modos de alimentação. Evidentemente, a boca deveria se adaptar, modificando a estrutura de seus componentes. A abelha faz parte dos insetos que provavelmente apareceram com o desenvolvimento das plantas com flores e que elas escolheram se alimentar do néctar dela. Então, seus apêndices bucais delas se alongaram e se especializaram, passando a ser do tipo "sucto-lamedor". Somente as mandíbulas parecem ter conservado, como relíquias, sua primitiva estrutura de peças mastigadoras. A língua ou glosa, se alongou em forma de trompa, enquadrada pelo lábio inferior e as maxilas ou mandíbulas inferiores, formado-se assim uma bainha ao redor dela. Assim equipada, nossa abelha pode lamber e aspirar as comidas líquidas que ela quer. Vistos ao microscópio, esses órgãos estão recobertos por numeroso cabelos, muitos dos quais têm uma função sensorial, principalmente esses que estão no fim da língua.

PRIMEIRA PARTE DA VIAGEM: A FABRICA DE MEL

Dentro da cabeça, e seguindo ao orifício bucal, se encontra uma cavidade: a faringe. Ela está unida a parede cuticular da cabeça por músculos que ao se contrair, permitem aumentar o seu volume. A depressão gerada por esta cavidade aumentada atua como uma bomba de vácuo, produzindo uma sucção que faz subir o néctar da flor até trompa e de lá até o esôfago. Este último apresenta movimentos ondulatórios, produzidos também por músculos que arrastam o líquido nutritivo para o outro extremo, aonde é entornado para a vesícula melífera. A vesícula é uma dilatação do tubo digestivo em forma de reservatório, capaz de conter 75 miligramas de comida (o que representa mais que 90% do peso "descarregada" da abelha que é em média de 82 mg). Por exemplo, nos deixe saber que para encher sua vesícula melífera uma campeira especializada em trevo visitará... entre 1000 a 1500 flores. Na vesícula melífera, o alimento sofre as primeiras transformações químicas graças à intervenção de sucos digestivos. Para a campeira o trabalho termina desde que, carregado com néctar colhido, ela volta à colméia onde regurgita seu conteúdo em uma célula antes de partir para novamente juntar infatigavelmente. Na colméia, o néctar fresco armazenado é trabalhado pelas operárias que primeiro evaporam uma parte boa da água que contém por meio da ventilação de suas asas. Então, o líquido já pastoso é reingerido pelas operárias que o submetem a isto aproximadamente durante vinte minutos por várias idas e vindas entre boca e vesícula melífera; aqui está presa a ação de sucos digestivos que voltam a regurgitam o produto transformado em mel. Aqui se faz necessário falar de certas glândulas cuja função sempre é digestiva, mas que intervêm na transformação dos alimentos: As glândulas hipofaríngeas ou "mamárias". São duas glândulas grandes localizadas na cabeça e rodeando o sistema nervoso central, prolongadas para abaixo e, desembocando na base da faringe. Suas secreções permitem as abelhas nutrizes a produção da Real Geléia que alimentará as larvas nos primeiros três dias das vidas delas e mais tarde para as futuras rainhas. Quando as operárias passam para o estágio de campeiras, estas glândulas, já inúteis, se atrofiam mas elas continuam segregando uma enzima que realmente participa na digestão dos açúcares.

As glândulas mandibulares: Localizadas, como o nome delas indica, nas mandíbulas, produzem um antibiótico que evita a decomposição por bactérias do alimento dedicado às larvas. Na rainha, estas mesmas glândulas produzem a famosa substância real.

As glândulas salivares: Uma na cabeça e outra no tórax, ambas, desembocam na base da trompa. Sua secreção aguada permite enriquecer ao mel em água quando for necessário e ajuda a dissolver os açúcares.

SEGUNDA FASE: ASSIMILAÇÃO

Fabricar mel é bom, mas também é necessário se alimentar para sobreviver. É por isto que todas as abelhas, sejam nutrizes, campeiras ou outro, estão obrigadas a levar para si uma pequena parte dos alimentos que transitam pelo seu organismo. Deixemos o néctar quando foi armazenado na vesícula melífera e já tinha sofrido um princípio de digestão; vejamos agora o que acontece depois. Seguindo a vesícula melífera, se encontra uma segunda cavidade de tamanho mais modesto: o proventrículo. Este cumpre funções de um verdadeiro filtro em vários sentidos. Em princípio, bloqueia o néctar na vesícula melífera, deixando passar somente as quantidades que a abelha precisa para a própria manutenção. Então, suprime do néctar contido na vesícula melífera (o mel futuro) todos os corpos estranhos e impurezas (grãos de pólen, bactérias, etc.) que são enviados ao intestino médio, prosseguindo assim sua viagem no tubo digestivo. Quando o líquido nutritivo chega ao intestino médio, sofre a fase final da digestão antes da assimilação. Atacado por todos os lados pelas enzimas digestivas, será degradado, "quebrado" e transformado em compostos mais simples diretamente utilizáveis pelo organismo. Estes cruzam a parede do intestino médio então eles são transformados, sem transição na hemolinfa (sangue) da abelha que os distribuirá para os órgãos diferentes em função das necessidades.

FASE FINAL: A EXCREÇÃO (Eliminação)

Uma vez feita a assimilação, sempre subsistem no intestino médio matérias ingeridas e transformadas, resíduos de digestão inutilizáveis para o organismo que serão expelidos. Estes são conduzidos naturalmente para o intestino posterior e desembocam no reto. Mas também os órgãos da abelha, nutridos pela hemolinfa, produzem igualmente quantidades de resíduos ao assegurar suas funções, estes resíduos que são entornados novamente na hemolinfa, devem ser imperiosamente evacuados já que a maior parte deles são toxinas poderosas, perigosas para o organismo. O mesmo problema se estabelece no sangue dos vertebrados que são limpos pelos rins. Na abelha, os órgãos que agem como rins são os "tubos de Malpigui". Trata-se de numerosos e pequenos canais do que são inseridos em união o intestino médio e do intestino posterior, seu outro extremo esta fechado. Ao entrar em contato com o hemolinfa, recapturam lá os resíduos nitrogenados (ácido úrico, etc) proveniente do uso de proteínas. Estes são então reconduzidos para o intestino e de lá para o reto. Os tubos de malpighi drenam igualmente uma grande quantidade de água para o tubo digestivo, dilui isso em sua parte maior eles cruzam a parede intestinal para ser novamente reutilizada. Finalmente, a operação que fecha esta longa cadeia de eventos é a excreção que libera lá ao reto todos os resíduos armazenados e que são feitos simplesmente através do ânus e durante o vôo.

Você pode achar então na digestão da abelha, numerosas analogias com o dos vertebrados, e em particular com o dos homens. Nós achamos certos órgãos de aspecto mais semelhante ou de funções semelhantes e de quem modalidades de funcionamento é bastante semelhante. Mas era necessário que os insetos sejam distintos por algum processo original. Realmente, eles puseram a ponto outro sistema de eliminação que não tem equivalente no Reino animal. Eles podem acumular sais minerais entre sí, ou compostos nitrogenados, e os armazenar debaixo da forma de pequenos cálculos em certas células, em particular na de epiderme. Em outra palavra, eles acumulam estes resíduos em sua cutícula e lá, este microcristais que possuem cores específicas em função da origem, jogam uma quantidade de pigmentos que colorem o corpo do inseto. Deste modo a alternação de faixas marrom e de faixas mais claras no abdômen da abelha, da mesma forma que o da vespa, é diretamente ligado a este fenômeno. Os resíduos estão então "congelados" de certo modo, debaixo de forma não perigosa, e então reutilizados para outras funções igualmente importantes já que a coloração dos insetos tem uma importância importante em seu comportamento (reconhecimento entre espécies, entre sexos dentro da mesma espécies, etc), mas a originalidade do sistema não cessa lá.

Nós sabemos que o crescimento dos insetos não é linear como o dos vertebrados; é feito de saltos e é observado por umas séries de mudas sucessivas para passar do estado larval ao estado ninfal e de lá para o adulto. Em cada mudança, o inseto abandona sua velha pele, já muito pequena para ele (exuvia), e que não é outra que sua antiga cutícula, para deixar passar um animal diferente provido de uma cutícula nova. Ao abandonar a sua velha cutícula, o inseto também abandona uma boa parte dos resíduos de digestão acumulados alí durante o estágio larval precedente; uma forma de excreção como qualquer outro, embora bastante incomum, é certo.

Este princípio apontado pela natureza pode ser qualificado como engenhoso pela mente humana. Mas não esqueçamos que é só um juízo do nosso ponto de vista sobre um fenômeno que, por outro lado, foi desenvolvido sem que nenhuma vontade engenhosa interviesse. É só o resultado de uma lenta evolução, produto de uma série de chances e de necessidades biológicas e de outro até mesmo, forças naturais desconhecidas. E é isto que faz mais bonito até mesmo, entre milhares de outros fenômenos tão ou mais bonitos que regem a vida sobre a terra. Cuidemos para conservar intactos para os milhões de anos que nos sobram de vida em conjunto!

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