MINHA EXPERIÊNCIA

Viabilidade da atividade apícola no estado de São Paulo, para pequenos e médios apicultores.

Marcos Fernando Tavolaro - Medico veterinário - Apicultor de 1985 a 1995 - Retorno a atividade em 2002. e-mail: mtavolaro@mmol.com.br

Resumo da palestra proferida na Reunião Plenária da APACAME realizada no dia 05 de abril de 2006, no Salão Nobre do Parque da Água Branca - São Paulo - SP.


Tornar a atividade rural viável, para pequenos e médios produtores de nosso estado tem sido o grande desafio para técnicos e profissionais da área, quer sejam eles do setor público, quer do setor privado.

A apicultura exerce forte atração sobre as pessoas, pelas vantagens sobre outras atividades rurais, para quem se dispõe a enfrentar algumas adversidades, tais como, o trabalho fora de horário, altas temperaturas dentro de macacões, chuvas, uma convivência direta com as matas, e para quem tenha a felicidade de fisicamente poder carregar peso, e se submeter á algum desgaste físico.

Falar sobre estas vantagens é fácil, na medida que para exerce-la, não é necessário que se tenha propriedade rural própria, os investimentos são relativamente baixos, há uma relativa rapidez no retorno, é plenamente compatível de ser exercida juntamente com outras atividades, pois ocupa pouquíssimo espaço na propriedade, o que facilita imensamente as famosas parcerias.

Outra vantagem a ser mencionada, é o fato do mel, como produto principal, não ser um produto perecível, o que permite ao apicultor estoca-lo, e, comercializar sua safra no momento de maior demanda e mais conveniente, conseguindo melhores preços.

Os preços se tornam bastante atrativos, a medida em que o produtor consiga se aproximar do consumidor final, vendendo sua safra diretamente, sem intermediários.

Pela facilidade como esses incríveis insetos se movimentam, e tendo em vista sua autonomia de vôo, áreas pequenas se tornam absurdamente grandes, e, portanto viáveis a projetos mais ambiciosos.

São extremamente auto-suficientes, o que permite o trabalho em horários de folga, aos finais de semana e feriados, num misto de hobby, e negócio. A manutenção é barata, exigem poucos cuidados se comparada à atividade leiteira, ou avícola que exigem o trabalho diário e exaustivo. Enquanto se gastam valores acima de R$ 100.000,00 para se montar um projeto de bovinocultura, e acima de R$ 200.000,00 para avicultura , com um quarto disso , monta-se uma pequena e enxuta estrutura apícola economicamente viável como atividade complementar.

  Exportações e mercado interno.  

Todos temos acompanhado o fechamento do mercado europeu, nosso principal mercado internacional, ao mel brasileiro.

Jamais nosso mel teve problemas de resíduos de agrotóxicos, ou de antibióticos.

Que fique bem claro, que o mel brasileiro, é, e sempre será muito bem conceituado na comunidade européia.

O que realmente ocorreu, é que por vários motivos, os órgãos fiscalizadores, diga-se o Ministério da Agricultura, não conseguiu cumprir as exigências de controle sobre resíduos (quer de antibióticos, quer de agrotóxicos) no mel brasileiro. Quando tentou faze-lo, não tinha laboratórios capacitados, que oferecessem credibilidade internacional, e a um custo insuportável às empresas.

Fato é que os exportadores, não aceitaram os preços absurdos que essas analises eram oferecidas, e nada fizeram.

De certo modo, o pequeno e médio apicultor deve se capacitar, a atingir com seu produto, o mercado consumidor interno.

Menos exigente em qualidade, com preços mais atrativos, pois não depende da cotação do dólar, nem de complexas estruturas, é acessível, e deverá ser a meta do pequeno e médio apicultor.

A dependência nas exportações pode tornar a atividade deficitária, pois os preços internacionais de mel, são compatíveis apenas com uma atividade em alta escala, conseguida em projetos acima de mil colméias.  

Adoção do sistema de renda complementar e de produção mista (fixo e migratório).    

Um misto de apicultura fixa, alternada com apicultura migratória tem se mostrado bastante eficaz.

Não que alguém vá ficar rico com a atividade, mas como renda complementar a quem tenha uma pequena propriedade, ou como atividade extra para quem tenha um bom emprego, o sistema misto tem se tornado o preferido.

Esse sistema seria adotado da seguinte forma:

Seriam montados diversos apiários, com no máximo 25 colônias, em locais estratégicos, aproveitando-se algumas microrregiões, com florada apícola abundante, onde as colônias tenham uma auto suficiência, com pouca ou nenhuma necessidade de alimentação artificial (muito cara). Acreditamos que apiários desse porte sejam suficientes para a viabilidade.

Quando da ocorrência de uma boa florada, na certeza de sucesso, migra-se somente com as colônias mais fortes (50%), para locais com floradas específicas, tais como eucaliptos, laranjeira, nabo forrageiro. Mas sempre na certeza, baixando, portanto o risco de insucesso. No caso de dúvida não se migra, e as abelhas ficam nos apiários fixos.

Apiários desse porte serão facilmente manejados por uma ou duas pessoas, somente nos horários fora do expediente normal.

O trabalho familiar e cooperativo deve ser adotado, com toda eficiência que lhe é peculiar, sendo desnecessária a contratação de funcionários.

Nesse modelo talvez a produção seja bem mais baixa, do que na apicultura migratória convencional, mas as despesas são mínimas.

Todas atividades relacionadas (fabricação de caixas, alveolagem de cera, limpeza de vasilhames, etc) , excetuando-se o trato com as abelhas, deve ser passada à terceiros.

Os apiários devem ser minuciosamente cuidados, mas deve se evitar visitá-los demais, para se diminuírem as despesas de frete, tempo, e combustível.

Nesse sistema, não se trabalha com divisão de enxames, nem com técnicas complicadas, que exijam freqüência nos apiários, a fim de diminuírem-se os custos, portanto a reposição de enxames deve ser muito grande, proveniente de caixas iscas em grande numero. Enxames fracos e zanganeiros, não são recuperados e sim unidos a enxames bons, e substituídos, no dia da revisão.

Trabalha-se com melgueiras ao invés de sobreninhos, mais rápidas para se completarem, e mais leves, mais praticas.

Os apiários são montados em lugares de fácil acesso, prevendo-se a proximidade com veículos para facilitar-se o trabalho. Devemos prever chuvas, plantações próximas, evitando-se os acidentes.

Locais seguros contra roubos, formigas, e quaisquer predadores, próximos a água.

Como estaremos trabalhando em propriedades de terceiros, o uso de dois fumegadores, deve ser adotado, e acesos com lenha, alem de telas para abelhas que possam escapar.Temos que fazer de tudo para não desagradar o dono da propriedade, pois para quem não é apicultor, duas abelhas formam um enxame.

  Do trabalho de seleção por produtividade.  

Nesse modelo, não adotamos técnicas especiais, nem complexas, pois o tempo é curto, e as despesas de viagens devem se controladas.

Então, ao final de cada florada, avalia-se a produção de todas as colméias.

Retiramos aquelas que nada, ou pouco produziram, e as mais fracas; levamos a um apiário de suporte.

Nesse apiário, faremos depois de 15 dias de alimentação, uma avaliação das crias, e da capacidade de recuperação desses enxames, mas seguramente a maior parte não tem qualidade, sendo necessária a substituição de rainhas ou a união de enxames.

Nesse caso, há realmente a diminuição de numero de colônias, mas o que o apicultor deve se preocupar é com o numero de abelhas, e não com o numero de colméias.

Por isso ressaltamos a necessidade de muitas caixas iscas, para a reposição desses enxames fracos e para esse simples trabalho de eliminação de colméias não produtivas.

  Dicas para caixas iscas  

Armar caixas velhas, apodrecidas, furadas, núcleos, enfim tudo que você dispuser em seu barracão. Nada deve ficar ocupando espaços inutilmente, evitando-se bagunça, e o aparecimento de pragas.

Usamos quadros com tirinhas de cera alveolada nova (5 cm ), e aramados.

Colocamos também, por questão de economia de tempo, e praticidade, 50% de quadros de favos velhos, pretos mesmos, cortados com 3 a 5 cm. Ganhamos em dois pontos, evitamos o trabalho de limpeza deles, e reduzimos a quantidade de quadros iscas.

Sobre a tampa, colocamos um pedaço de plástico (preto ou de estufas). Fazemos uma alça de arame, para pendurar as caixas em arvores.

Devemos evitar áreas onde haja incidência de muita formiga, pois um enxame novo, que entra, possui pouca defesa, e pouco pode fazer contra esses predadores.

As caixas devem ser armadas em locais secos, nas beiradas das matas, onde não devem atrapalhar a circulação de veículos, nem de pessoas. A convivência com animais é harmoniosa, não se tornando um problema.

Quem gosta de umidade é formiga, e não abelhas, portanto um pouco de sol é muito bom. Adotamos também o uso de Chama enxame, o que aumentou consideravelmente as capturas Essa caixas iscas, não mais voltarão ao nosso barracão, ficando o ano todo armadas, sendo a cada dois meses, limpas e reformadas. Caso peguem marimbondos, ou formigas, as mesmas são eliminadas com o fumegador, com asfixia por fumaça, e mudadas de lugar. Quando retiramos os enxames, muitas vezes de dia mesmo, recolocamos os caixilhos retirados na hora, com iscas novas, e rearmamos a caixa uns dez metros distantes do local original, evitando-se que as campeiras retornem a ela, o que impede a entrada de novos enxames.

A época mais promissora de se pegar enxames em caixas iscas, é o período que antecede as grandes floradas, e durante as boas floradas. Na nossa região são épocas de florada do cipó uva (junho/julho) e no início do ano na florada do eucalipto(fevereiro/março).

Observamos que a captura é bem melhor em épocas de estiagem, e não durante as chuvas quando se pegam muitas formigas e marimbondos. Durante as revisões das caixas iscas, todo trabalho de limpeza, reposição de caixilhos e colocação de chama enxame, é feita no local, evitando-se gastos de tempo e de viagens.

  Para quem for migrar  

Planeje bem, para não se arrepender. Encontre locais bons, seguros, e que não se tenha pressa de desocupa-los. Nada de compromissos impossíveis motivados pela empolgação. Remover apiários as pressas é muito desgastante, portanto não se comprometa com coisas que não possa cumprir. Negocie um arrendamento barato, pois a produção não é tudo lucro, seu lucro girará em 30% da produção no máximo.

Use cavaletes tipo cadeirinha, telas de transporte, caixas boas, mas é imprescindível uma tela sobre as caixas, chamada de telão (feita de sombrite ).

Faça sempre um check list, e confira se não esqueceu de nada.  

Macacões, luvas, bota, enfim todo tipo de proteção necessária.

Dois fumigadores, fósforos, lenha, combustível para queimar.

Telas, telão, lonas, cordas.

Enxada, foice, facão, formão de apicultor.

Caixa de ferramentas, pregos diversos, martelo.

Moringa de água (duas uma para você e outra para as abelhas).

Papel higiênico, uma troca de roupas, uma pequena toalha.

Caixas com fundo, tampas extras, cavalete, melgueiras.

Pulverizador para união de enxames, e outro para combater formigas.

Kit primeiros socorros

Mata mato

Água para limpeza de mãos

Veiculo documentado, estepe perfeito.

  Deixar sempre planejado um "plano B" caso não consiga chegar ao destino por quebra do veículo, ou por algum outro problema. Tenha soluções rápidas sempre a mão.

Acertar o lugar primeiro, planejar, chaves de porteiras na mão, e mãos a obra.  

Ciclo da apicultura na região de Brotas /São Carlos

  Principais floradas de interesse  

- Fevereiro, março, abril: Eucaliptos
- Julho, agosto: cipó uva
- setembro, outubro, novembro: laranjeira
- novembro, dezembro: capixingui
- abril, maio: nabo forrageiro

  As floradas de eucaliptos, laranjeira e cipó uva, feita no próprio município, ou áreas no máximo a trinta km da nossa base.

Nabo forrageiro em Mato Grosso, 1000 km, e capixingui no Paraná, 300 km, na cidade de Wenceslau Brás.

Nas épocas antecedentes das floradas, armar caixas iscas, exceto no período da florada de laranjeira que os resultados são fracos, pois a florada é muito melífera, mais muito curta e não chega a promover enxameação.

  Conclusão.  

Acreditamos muito na atividade apícola, como renda complementar ou atividade extra na propriedade rural.

Apesar de polemica, a venda de mel colhido de maneira eficiente e higiênica, não oferece de forma alguma risco à saúde do consumidor, sendo preconizada a venda direta aos pontos de venda ou até ao consumidor final.

A venda no atacado ou para entrepostos exportadores, deve ser restrita a grandes produções, ou ao excedente de nossa produção.

Os pequenos detalhes é que fazem a diferença, sendo que neles reside a possibilidade de se prosperar ou malograr.

Não se deve sonhar que esta atividade remunere excepcionalmente, mas em toda atividade rural é assim. Vejam a crise dos frangos, motivada pela gripe aviária, a crise da soja, provocada pelo dólar e pelo mercado com muita oferta, a crise do milho, do leite, da carne, etc.

Nós produtores temos que aprender viver em crise, mas parece que a bola da vez é o mel.

Se não podemos fazer nada para mudar o mercado, se a oferta é maior do que a demanda é obvio que os preços caem. Vamos reduzir despesas, apertar mais uma vez o cinto, e vamos produzir mais. Parece-me que nenhum de nós esta com mel em excesso para vender.

Temos que achar um diferencial para nossa produção, para conseguirmos um melhor preço.

Temos que encontrar uma solução para nossa atividade, e passar por esse momento com humildade e dignidade. Estive na atividade por dez anos, parei por outros dez. O cenário hoje me parece melhor. Devemos voltar a exportar para Europa em um ano, até lá, temos que nos virar.

Retornei a atividade em 2002, para aproveitar um empréstimo do FEAP, linha de credito rural da Nossa Caixa, e não me arrependo. Devagar vamos indo.

Mãos à obra!!

Retorna à página anterior