Artigo

PARÂMETROS FISICO-QUÍMICOS PROPOSTOS PARA O CONTROLE DE QUALIDADE DO MEL DE ABELHAS INDÍGENAS SEM FERRÃO NO BRASIL

Jerônimo Kahn Villas-Bôas¹ e Osmar Malaspina²
1, 2 - Centro de Estudos de Insetos Sociais/Departamento de Biologia, IBRC, UNESP, Rio Claro jeronimo@rc.unesp.br


Atualmente, a criação de abelhas pode ser dividida em duas práticas distintas, a Apicultura e a Meliponicultura. A apicultura caracteriza-se pelo manejo da espécie Apis mellifera, sua prática é muito mais difundida pela sociedade, detentora de tecnologia mais desenvolvida, padrões de produção bem definidos e características de seus subprodutos mais conhecidas. Entende-se por meliponicultura a arte de manejar as abelhas indígenas sem ferrão, sendo a obtenção de mel um dos objetivos dessa atividade (NOGUEIRA-NETO, 1997). O desenvolvimento da meliponicultura é formalmente atribuído à civilização mesoamericana dos Mayas, especialmente pelo manejo da espécie Melipona beecheii (WEAVER ; WEAVER, 1981; CRANE, 1992).

O principal produto destas atividades, o mel, pode ser definido como uma mistura complexa de açúcares altamente concentrada, produzido a partir do néctar e outras exsudações naturais das plantas que são coletadas, processadas e armazenadas pelas abelhas (CRANE, 1983). Além de sua finalidade alimentar, possuindo potencial calórico superior ao açúcar cristalizado, propriedades medicinais do mel estão sendo descobertas e estudos com esta finalidade têm dado grande ênfase ao mel de meliponíneos.

A cada dia a meli-ponicultura ganha mais espaço no cenário nacional e mundial. Países neotropicais como México, Panamá, Colômbia, Venezuela, Cuba, Costa Rica e Brasil se destacam nesta prática, também desenvolvida em países como a Índia e nos continentes australiano e africano. Desde 1910 ten-tativas positivas de pla-nejamento de um modelo racional de colméia para a criação de abelhas sem ferrão estão sendo realizadas, como Langstroth e outros fizeram para as Apis (CRANE, 1992). Estes modelos buscam facilitar a coleta do mel, otimizar o processo de reprodução de enxames e garantir a preservação do ninho. As espécies com grande potencial produtivo também estão sendo es-colhidas, entre elas algumas já se destacam, como as Melipona com-pressipes, M. scutellaris, M. seminigra e M. subnitida, todas presentes no território nacional.

Muitos estudos espe-cíficos sobre a biologia dos meliponíneos têm sido realizados, em especial no Brasil, onde a maioria destas espécies ocorre (CRANE, 1992). Estas informações são muito importantes para orientar o manejo destas abelhas e têm sido publicadas em revistas nacionais e internacionais, além de abordadas em eventos como congressos e encontros regionais. No Brasil, a importância dos conheci-mentos científicos em torno do manejo das abelhas sem ferrão teve como marco definitivo o 1o Congresso Brasileiro de Meliponicultura, ocorrido em Natal no ano de 2004, concomitantemente ao XV Congresso Brasileiro de Apicultura.

Entretanto, a melipo-nicultura não se restringe aos enfoques acadêmicos, o mel das abelhas sem ferrão é extremamente apreciado pelo seu sabor peculiar e muitas vezes procurado por suas propriedades tidas como medicinais, atingindo preços altos no mercado informal. Alguns produtores já detêm um número significativo de colônias, e a produção nacional cresce a cada ano, impulsionada pelo desenvol-vimento de tecnologia específica.

As regiões norte e nordeste se sobressaem como grandes berços para o sucesso da meliponicultura de mercado, fato relacionado ao clima, às espécies existentes e disponibilidade de recursos florais. Entre as abelhas manejadas se destacam no nordeste a Uruçu Nordestina (Melipona scutellaris), principalmente nos estados Pernambuco, Paraíba e Ceará; a Jandaíra (Melipona subnitida) no Rio Grande do Norte; Mandaçaia (Melipona mandacaia) e Melipona asilvai na Bahia; e Tiúba (Melipona compressipes) no Piauí e Maranhão. Variedades da Melipona compressipes também ocorrem na região Norte, onde é conhecida como Jupará, principalmente no estado do Amazonas. A Uruçu-Boca-de-Renda, como é conhecida a espécie Melipona seminigra neste estado, tem se mostrado como grande alternativa para o manejo de abelhas sem ferrão na região, atingindo grandes taxas de produção e ótimas respostas às iniciativas de manejo (esta espécie também é conhecida como Jandaíra-Amarela-Grande).

Espécies do gênero Scaptotrigona e a Uruçu-Cinzenta (Melipona fasci-culata) também estão sendo manejadas com sucesso no Pará.

Entre as abelhas indígenas sem ferrão, a Jataí (Tetragonisca angustula), pode ser considerada a mais conhecida no Brasil, pro-duzindo um dos méis mais consumidos e alcançando elevado preço no mercado. Esta abelha possui ampla distribuição geográfica, ocorrendo em todo o território nacional e, apesar da baixa quantidade de mel produzido por colônia, já vem sendo manejada há muito tempo em diversas regiões do país, caracterizando-se como espécie protagonista da meliponicultura nas regiões sudeste e sul. Muitos produtores chegam a ter centenas de colméias de Jataí.

Durante muito tempo o consumo do mel de meli-poníneos foi privilégio de comunidades tradicionais através da exploração predatória das colônias existentes em hábitat natural. O envolvimento destas comunidades com a criação racional de abelhas indígenas sem ferrão é uma prática incipiente no Brasil, entretanto, tem se destacado por compatibilizar de forma positiva a utilização não predatória de recursos naturais e geração alternativa de renda. Um bom exemplo do sucesso deste envolvimento é o caso de Boa Vista do Ramos, um dos menores municípios do estado do Amazonas, onde 17 de suas comunidades repre-sentadas por mais de 50 famílias manejam aproxima-damente 1500 colônias, tendo atingido uma produção de três toneladas de mel no ano de 2004. Algumas técnicas utilizadas em Boa Vista do Ramos se difundiram pela região amazônica e estão sendo empregadas em outros municípios.

Dessa forma, além de se caracterizar como grande incremento às práticas agrícolas do país, a criação de abelhas sem ferrão é hoje uma das possibilidades de inovação para os produtos alimentícios disponíveis no mercado, sendo capaz de ocupar a mão de obra familiar e gerar renda para pequenas propriedades rurais. Entretanto, são relativamente recentes os estudos que descrevem as características naturais do mel de meliponíneos, sendo ainda inexistente um controle de qualidade que assegure aos produtores uma comercia-lização legal e aos con-sumidores a compra de produtos idôneos (SOUZA e BAZLEN, 1998).

Países como México, Guatemala e Venezuela já possuem propostas para o controle de qualidade do mel de suas abelhas sem ferrão, apoiados pela grande linha de pesquisa nesse tema de-senvolvida pela pesquisa-dora venezuelana Patrícia Vit, do Departamento Ciencia de los Alimentos da Universidad de Los Andes, em Mérida, Venezuela (VIT, 1994, 1998 e 2004; BOGDANOV, 1996).

Apesar de muito apreciado, o mel é um produto de fácil adulteração com açúcares ou xaropes, sendo comum encontrar imitações do mesmo no mercado. Assim também ocorre com o mel de meliponíneos, cuja venda de falsificações é facilitada pelo desconhecimento de muito de seus compradores do sabor original. Não é raro ouvir relatos sobre falsos méis de Jataí, assim como de outras Melíponas (dados não publicados).

As primeiras infor-mações sobre a composição do mel de abelhas sem ferrão foram dadas por Paulo Nogueira-Neto em 1953, a partir de uma amostra de mel de Melipona quadrifasciata (VIT, 1994). Desde então, principalmente nos últimos dez anos, surgiram outros estudos dessa natureza, entretanto ainda é escasso o número de trabalhos produzidos sobre a composição do mel de meliponíneos, existindo poucas publicações em revistas científicas, estando a maior parte das informações disponíveis em anais de congressos e encontros (CORTOPASSI-LAURINO e GELLI, 1991; SOUZA, 1998; MARCHINI, 1998; SILVA, 2002; DENADAI, 2002; ALMEIDA, 2004; ALVES, 2004; VILLAS-BÔAS, 2004; SOUZA, 2004; SOUZA, 2004).

O presente trabalho tem como objetivo sugerir os padrões físico-químicos do mel produzido por abelhas indígenas sem ferrão de todo o Brasil para embasamento de norma regulamentadora e de controle de qualidade, visando sua comercialização legal em todo o território nacional.

É importante destacar que a composição exata de qualquer mel depende, principalmente, das fontes vegetais das quais ele é derivado, mas também do clima, solo e outros fatores, e dois méis nunca são iguais (CRANE, 1983), estando suas características diretamente relacionadas ao local de produção. Este fato dificulta a proposição de uma única norma para todo o Brasil, país rico em espécies de meliponíneos e caracterizado por um grande mosaico de habitats e formações vegetais. Ao mesmo tempo, são escassos os conhecimentos sobre as características físico-químicas específicas dos méis de todo o país, estando presentes nos parâmetros aqui propostos, valores que visam englobar o mel de todas as espécies e habitats. A iniciativa desta proposição visa valorizar a melipo-nicultura, incentivando o seu crescimento. Este cresci-mento está diretamente relacionado ao aumento de setores envolvidos e volume de produção, que por sua vez incentivam a busca por conhecimentos mais pro-fundos sobre as carac-terísticas do mel, dando subsídios para controle mais específico de qualidade no futuro.

A realização deste trabalho contou com o apoio do projeto Balcão de Serviços para Negócios Sustentáveis, que integra a entidade Amigos da Terra - Amazônia Brasileira, organização não governamental existente no Brasil desde 1989, atuante na promoção do uso sustentável dos produtos florestais, na prevenção do fogo, no atendimento a comunidades isoladas e na formulação e acompanhamento de políticas públicas. A proposição do controle de qualidade paro o mel de meliponíneos é fruto das iniciativas tomadas pelo Balcão de Serviços para Negócios Sustentáveis, através da elaboração de planos de negócio aos empreendimentos apoiados como o Instituto Iraquara e à ACAIÁ (Associação de Criadores de Abelhas Indígenas da Amazônia) em Boa Vista do Ramos (AM).

MÉTODOS

A determinação dos valores propostos para a regulamentação das características físicas e químicas do mel de abelhas indígenas sem ferrão foi realizada por meio de pesquisa bibliográfica de trabalhos referentes a este tema publicados no país nos últimos dez anos, período no qual houve um número significativo de trabalhos nesta área.

Assim como ocorre para o mel de Apis mellifera, valores máximos e mínimos para cada parâmetro foram propostos, após o diagnóstico das características já pesquisadas. O artigo publicado por Patrícia Vit (2004) que propôs padrões de qualidade para o uso do mel de meliponíneos da Guatemala, México e Venezuela, foi uma das referências para o trabalho aqui proposto, embora seu objetivo tenha sido a proposição de padrões de qualidade para o uso medicinal. O presente estudo considera o uso alimentar deste mel, levando em conta que outras abordagens, como a ação de alguns compostos secundários, devem ser dadas para a regulamentação do uso medicinal deste produto.

Os mesmos valores sugeridos pela venezuelana foram aproveitados quando todos os dados de deter-minado parâmetro, encontra-dos nas publicações nacio-nais, eram compatíveis com o intervalo indicado naquele trabalho. Caso contrário, a proposição daquele estudo foi modificada, por exemplo: O mínimo valor encontrado para açucares redutores no Brasil foi 65,36%(± 1,91) no trabalho de Villas-Bôas e Malaspina (2004), mas o mínimo valor sugerido por Patrícia Vit foi 50%; neste caso permanece a proposição 50% para o mel nacional. Por outro lado, o trabalho da venezuelana determinou como 30% o máximo de umidade para o mel de meliponíneos da Guatemala, México e Vene-zuela, enquanto que no Brasil tivemos amostras de mel com 34,6%(± 0,5) de água, tendo sido modificado para 35% o valor proposto para o parâmetro umidade.


RESULTADOS E DISCUSSÃO

Vit (2004) propôs parâmetros para o controle de qualidade do mel de meliponíneos diferenciando-o em três gêneros (Melipona, Scaptotrigona e Trigona). Estes três grupos foram escolhidos como represen-tativos para toda a subfamília com base em trabalho prévio, que os diferenciou através de análises estatísticas multiva-riadas (VIT, 1998). Entretanto, os parâmetros aqui propostos não consideram esta sugestão, englobando todos os gêneros, uma vez que os trabalhos existentes no Brasil não dão subsídios para tal diferenciação. Contudo, considerando alguns parâme-tros marcantes que diferen-ciam o mel de meliponíneos do mel de Apis, este trabalho julga como significativo os valores atribuídos para o controle de qualidade, mesmo porque, para efeito de fiscalização, este modelo facilita a organização dos órgãos públicos responsáveis.

Os parâmetros defini-dos na Instrução Normativa No 11, de 20 de Outubro de 2000, pelo Ministério da Agricultura e do Abastecimento, para controle do mel de Apis mellifera, são os mesmos aqui propostos para o controle do mel de abelhas sem ferrão, e são: açúcares redutores, sacarose, umidade, sólidos insolúveis, sais minerais, acidez, atividade diastásica e hydroximetilfurfural (HMF). Apenas os valores foram modificados. Os mesmos parâmetros foram utilizados por Vit (2004), com exceção do parâmetro "sólidos insolúveis", não utilizado na proposição da autora.

Os valores propostos para o controle de qualidade estão na tabela 1, também comparados ao mel de Apis e com a sugestão de Patrícia Vit:

Por ser uma solução altamente concentrada de açúcar, para um produto natural, o mel é notavelmente higroscópico: ele absorve água muito rapidamente sob certas condições (CRANE, 1983). A quantidade de água no mel de meliponíneos é considerada o grande diferencial deste produto em relação ao mel de Apis mellifera, como evidenciou a maioria dos trabalhos brasileiros pesquisados. Dessa forma, é proposto que 35% de água seja permitido para o comércio do mel das abelhas sem ferrão no Brasil, valor superior aos 20% de umidade permitido para Apis e 30% sugerido para o mel dos meliponíneos da Guatemala, México e Venezuela. Esta característica merece cuidados na manipulação do mel durante a coleta e no processo de armazenamento, evitando a contaminação por microor-ganismos que causem depreciação do produto (SOUZA, 2004). Afinal, o conteúdo de água do mel, junto com o número de células fermentadas nele, determinam se e quando o mel fermentará a uma dada temperatura (CRANE, 1985), podendo caracterizar uma desvan-tagem do alto teor de água do mel de meliponíneos. Por outro lado, essa característica está diretamente relacionada ao sabor do produto, muito apreciado por ser menos doce e enjoativo.

Além disso, esta característica pode ser usada vantajosamente, pois o mel pode comunicar a propriedade desejável de suavidade ou umidade aos produtos alimentícios ao qual é incorporado (CRANE, 1983). A questão de manipulação e segurança contra a contaminação é resolvida pelas exigências do Ministério da Agricultura apresentadas no Regulamento Técnico Sobre as Condições Higiênico-Sanitárias e de Boas Práticas de Elaboração para Es-tabelecimentos Elaboradores/Industrializadores de Ali-mento1, destinado à comer-cialização de qualquer produto de origem animal. O controle microbiológico deve ser o mesmo aplicado à qualquer alimento, definido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária2 (Resolução no 12, de 2 de janeiro de 2001). A durabilidade do produto pode ser resolvida com a de-sumidificação do mel, iniciativa já tomada por alguns meliponicultores (dados não publicados), sendo a pequena alteração da composição original uma opção do produtor. Mesmo desumidificado, o mel continua dentro dos padrões aqui propostos, já que a determinação só sugere o máximo de 35% de umidade;

Os valores aceitos para açúcares redutores foram diminuídos para o mínimo de 50%, diferente dos 65% mínimos para o mel de Apis mellifera. O mesmo parâmetro foi sugerido por Patrícia Vit;

Em relação à saca-rose, o mel de Apis mellifera pode ser vendido com uma quantidade máxima de 6,0% deste dissacarídeo. O mesmo valor máximo foi atribuído para o mel de meliponíneos da Guatemala, México e Venezuela, da mesma forma acontecendo para as abelhas sem ferrão do Brasil na proposta aqui apresentada;

A acidez do mel das abelhas sem ferrão costuma ser muito alta em relação ao de Apis mellifera, fato detectável pelo sabor (VIT, 2004), constituindo um dos parâmetros que define a preferência do consumidor pelo mel das abelhas nativas. Entretanto, a acidez pode estar diretamente relacionada ao estado de maturação do mel, aumentando com a fermentação (VIT, 2004). O valor proposto no presente estudo estabelece o máximo de 85 miliequivalentes de acidez/kg de mel para o mel de meliponíneos fresco, assim como a sugestão venezue-lana. Pela legislação vigente, o mel de Apis mellifera não deve ultrapassar 50 meq/kg;

Os sais minerais presentes no mel de meli-poníneos não devem exceder 0,6%, assim como o mel de Apis mellifera;

Os sólidos insolúveis presentes em determinado mel estão diretamente relacio-nados ao seu processo de coleta e beneficiamento, assim como aos hábitos das abelhas que o armazenaram. Considerando que os méto-dos de coleta do mel amostrado nos trabalhos publicados no Brasil respei-tam as condições de higiene e contaminação, o conteúdo de sólidos insolúveis aumentou para 0,4% para o controle do mel de abelhas sem ferrão, diferindo dos 0,1% permitido para o comércio do mel de Apis mellifera, também atribuído ao mel das abelhas nativas da Guatemala, México e Venezuela;

O hidroximetilfurfural, comumente chamado de HMF, é o principal composto secundário analisado para o controle de qualidade do mel. Este composto resulta da quebra de açúcares hexoses, tais como glicose e frutose, na presença de um ácido (CRANE, 1983). O conteúdo desta toxina tem assumido grande importância no controle de qualidade de méis, uma vez que sua quantidade está relacionada aos processos de beneficiamento e armazenagem.

Méis muito aquecidos ou armazenados por muito tempo costumam apresentar altos teores de HMF, assim como as adulterações feitas com xarope de milho ou beterraba. O mel de meliponíneos costuma apresentar quantida-de menor de HMF em relação ao mel de Apis, tendo sido diminuído na presente proposta a tolerância por esta toxina. A legislação vigente permite a comercialização do mel de Apis mellifera com 60 mg/kg de HMF. O mel de abelhas indígenas deve apresentar no máximo 40mg/kg, assim como foi proposto por Patrícia Vit;

Nenhuma publicação levantada continha dados sobre a atividade diastásica do mel de abelhas sem ferrão. Entretanto, laudos fornecidos pelo Centro de Estudos de Insetos Sociais (CEIS) da UNESP de Rio Claro, local no qual foram analisadas amostras de mel provenientes de Boa Vista do Ramos (AM), contém informações sobre a diastase deste mel, tendo sido utilizados para a proposição aqui presente. Assim como sugeriu VIT (2004), o valor mínimo de atividade diastásica para o mel de meliponíneos do Brasil deve corresponder a 3,0 na Escala Gothe. O mínimo permitido para o mel de Apis mellifera corresponde a 8,0.

O hidroximetilfurfural, comumente chamado de HMF, é o principal composto secundário analisado para o controle de qualidade do mel. Este composto resulta da quebra de açúcares hexoses, tais como glicose e frutose, na presença de um ácido (CRANE, 1983). O conteúdo desta toxina tem assumido grande importância no controle de qualidade de méis, uma vez que sua quantidade está relacionada aos processos de beneficiamento e armazena-gem.

Méis muito aquecidos ou armazenados por muito tempo costumam apresentar altos teores de HMF, assim como as adulterações feitas com xarope de milho ou beterraba. O mel de meliponíneos cos-tuma apresentar quantida-de menor de HMF em relação ao mel de Apis, tendo sido diminuído na presente proposta a tolerância por esta toxina.

A legislação vigente permite a comercialização do mel de Apis mellifera com 60 mg/kg de HMF. O mel de abelhas indígenas deve apresentar no máximo 40mg/kg, assim como foi proposto por Patrícia Vit;

Nenhuma publicação levantada continha dados sobre a atividade diastásica do mel de abelhas sem ferrão. Entretanto, laudos fornecidos pelo Centro de Estudos de Insetos Sociais (CEIS) da UNESP de Rio Claro, local no qual foram analisadas amostras de mel provenientes de Boa Vista do Ramos (AM), contém informações sobre a diastase deste mel, tendo sido utilizados para a proposição aqui presente. Assim como sugeriu VIT (2004), o valor mínimo de atividade diastásica para o mel de meliponíneos do Brasil deve corresponder a 3,0 na Escala Gothe. O mínimo permitido para o mel de Apis mellifera corresponde a 8,0.

É possível concluir que o mel de abelhas indígenas sem ferrão possui diversas características diferenciadas do mel de Apis mellifera. Aliado ao fato da produção nacional deste alimento crescer a cada ano, evidencia-se um motivo lógico para que exista um modelo diferenciado de controle para o mel de meliponíneos. É preciso lembrar que o termo "mel" já é mundialmente associado ao produto da apicultura, fazendo com que, por ser um produto totalmente diferente, o mel de meliponíneos não possa ser chamado dessa forma. O termo "iramel" foi proposto pelo Prof. Paulo Nogueira-Neto durante o 8th International Conference on Tropical Bees and VI Encontro sobre Abelhas. A pesquisadora Patricia Vit propôs o termo "divine elixir". Embora nos pareça que o primeiro nome é o mais adequado, cabe a todos os meliponicultores envolvidos definir como deverá ser chamado o mel das abelhas nativas.

REFERÊNCIAS

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