Artigo

A traça pequena da cera: (Achroia grisella, Lepidoptera: Pyralidae)
encontrada em colônias de abelhas sem ferrão.  Noções gerais- 1 -

Olga Inés Cepeda-Aponte,
Vera Lucia Imperatriz-Fonseca –-2-
ocepeda@usp.br   vlifonse@ib.usp.br
Hayo H.W. Velthuis –3-
H.H.W.Velthuis@bio.uu.nl

-1- Apresentado no IV ENCONTRO SOBRE ABELHAS, Set.6 A 9/2000, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil
-2- Universidade de São Paulo, Instituto de Biociencias, Laboratório de Abelhas
Rua do Matão, Travessa 14 no. 321
CEP: 05508-900 São Paulo, Brasil
-3- Universidade de Utrecht, Dep. de Etologia e Socio-ecologia
PO Box 80.086, 3508 TB Utrecht, Países Baixos
 
 

RESUMO

    Este é o primeiro relato formal da ocorrência da traça Achroia grisella em colônias de meliponíneos. Por ser uma praga muito comum das diversas espécies de abelhas Apis, sua biologia e historia natural são bem conhecidas entre apicultores, mas não entre meliponicultores. Aqui apresentamos uma curta revisão das principais características da traça, junto com os métodos de controle usados no laboratório de abelhas da USP, São Paulo.

    Palavras principais: Lepidoptera, Traça, Praga, Apis, Meliponinae
 


REVISÃO GERAL

    A traça comum da cera, Galleria mellonella, e a tracinha Achroia grisella pertencem `a mesma família de borboletas: são Pyralidae e têm muitas características comuns. São adaptáveis e cosmopolitas, encontradas como pragas das abelhas Apis, desde a antigüidade e em cada apiário do mundo. Na Índia, A. grisella é encontrada em maiores altitudes que a traça da cera G. mellonella. (Singh, 1962). É comum a sobrevivência de A. grisella dentro das colônias, nos frios invernos de altas latitudes (Crane, 1990).

    Adultos, larvas e pupas de A. grisella são sempre menores que os de G. Mellonella (Figura 1). O tamanho do adulto depende da quantidade de alimento consumido na forma larval (Singh, 1962). Os machos podem ter de até 10 mm de comprimento, enquanto que as fêmeas podem crescer até 13 mm. Seu corpo é pequeno, delgado e de cor prateada, que contrasta com sua cabeça amarela (Morse, 1978) (Figura 2). Em geral, o estágio de ovo dura de 2 a 4 dias e tem 10 fases larvais (Guerra, 1973), que no total duram de 34 a 48 dias. A fase pupal dura de 5 a 12 dias (Figura 3). Estes períodos podem mudar dependendo das condições da temperatura: o calor acelera seu desenvolvimento. O adulto vive aproximadamente uma semana (Singh, 1962; Crane,1990).


Figura 1:  Tamanhos e Fases do desenvolvimento em Achroia grisella.
A. O crescimento da larva
B. B esq. Casulo da Pupa - B dir. Seda com pedaços de cera de abelhas que envolve o casulo pupal
C. C esq. Fêmea – C dir. Macho


Figura 2: Vista lateral e ventral de adultos de Achroia grisella
Figura 3: Casulo envolvido em cera de meliponíneos. Antes e depois de nascer


EM COLÔNIAS DE APIS

    Para infestar colônias de Apis, uma traça fecundada entra em um ninho fraco e pode colocar de 250 a 500 ovos (Singh, 1962; Morse, 1978). Ao nascer, as larvas tecem túneis para sua proteção, e alimentam-se de pedaços roídos de cera e outros detritos. Não conseguem sobreviver apenas de cera pura de abelhas, e portanto derivam suas proteínas dos restos de pólen, casulos e seda deixadas pelas abelhas ao nascerem (Singh, 1962). Ocasionalmente, A. grisella come alguns opérculos da cria fechada, daí as abelhas limpam o resto causando a condição conhecida como “cria careca” (Baily, 1981). As colônias definham até que as abelhas as abandonam (Schenk, 1938, OIRSA, 1988). Nas ilhas Fiji, 70% das colônias estudadas foram encontradas  infestadas pela traça (Anderson, 1990).

    A traça maior (G. mellonella) foi encontrada em ninhos de meliponíneos levados para a França. Também foram encontradas morando em ninhos de meliponíneos da Austrália. No Brasil, ambas espécies de traças são relacionadas à Apis mellifera desde 1938 (Schenk, 1938), e ocasionalmente, traças e microlepidópteros tem sido observados em colônias de abelhas sem ferrão (Nogueira-Neto, 1997). Em 1973, em Piracicaba (São Paulo), se fizeram estudos morfológicos e biométricos tanto em G. mellonella como em A. grisella (Guerra, 1973).

    Em colônias de Apis mellifera, utilizam-se armadilhas de luz para capturar os adultos das traças. Os métodos químicos incluem fumigar favos com paradiclorobenzeno, que é uns dos compostos químicos menos perigosos de se manipular, mas pode ser absorvido pelo mel. Outro tratamento inclui irradiar os machos das traças com raios gama para esterilizá-los. Sendo que as fêmeas são atraídas pelos machos por meio de pulsos ultra-sônicos, o uso de ultra-sons tem potencial para controlar a espécie (Crane, 1990). Quantos aos métodos de controle biológico, o uso de “sprays” com vírus suspensos são muito custosos. Já o uso de hormônios juvenis, resulta na redução do número de larvas que se desenvolvem em adultos, mas também afeta as abelhas. O método que melhores resultados têm proporcionado é usar cepas do Bacillus thuringiensis, que matam um grande número de larvas de traças e borboletas (Lepidoptera) (Baily, 1981; Crane, 1990, OIRSA, 1988; Singh, 1962).
 


EM COLÔNIAS DE MELIPONÍNEOS

    No laboratório de abelhas da USP, em fevereiro de 2000, A. grisella foi encontrada em uma colônia fraca de Melipona bicolor bicolor (ninhos fortes não são invadidos) e em uma colonia de Melipona quadrifasciata anthidioides (F. Contrera. com. pes.). Foram capturadas larvas de todos tamanhos morando dentro do lixo acumulado, em meio de velhas folhas de invólucro, embaixo do último favo de cria e entre pedaços quebrados de batume, onde gostam de empupar. Em uma caixa vazia, mas com resíduos de cera, também foram encontradas larvas. Entretanto, a maior quantidade de indivíduos em todos os estágios de desenvolvimento, foi encontrada em uma balde, onde se recolhia cera de diversas espécies de meliponíneos (Figura 4). Assim, é demostrada a fácil sobrevivência e oportunismo desta traça e recomenda-se otimizar as medidas de limpeza em colônias abandonadas ou velhas.


Figura 4: Balde com cera de meliponíneos infestado com Achroia grisella.
Método de captura de adultos com luz.

    Em colônias de observação experimentais conseguiu-se capturar os adultos das traças utilizando o método da luz um pouco modificado pois adicionou-se o uso de parafina liquida, que e encontrada em lojas de artesanato de velas. O método consistiu em revestir com esta parafina a face interna da tampa de vidro da colônia e colocou-se uma fonte de luz do lado de fora (Figura 4). Esta atraía as traças, que ficavam presas na parafina. As larvas devem ser capturadas à mão, o lixo deve ser retirado, e as colônias devem ser revisadas e limpas todo dia durante a infestação, pois as fêmeas colocam numerosos ovos. As larvas novas são diminutas, difíceis de ver num dia só e escapam com facilidade (esquerda, Figura 1). Podem ser encontradas em até um mês depois da primeira limpeza.
 


CONCLUSÕES

    Existe pouca informação sobre as pragas das abelhas sem ferrão. Por enquanto, a fonte mais completa é o livro do Dr. Paulo Nogueira Neto (1997). Para inimigos em comum com Apis, a meliponicultura pode aproveitar a experiência já adquirida em apicultura com relação aos mecanismos de controle e erradicação. Mas a meliponicultura cresce em importância como atividade de lazer, de estudo, e como meio de desenvolvimento sustentável. Por isso, é necessário o conhecimento do manejo das pragas que possam impedir a sua prática;  infestações e infeções deveriam ser temas de grande peso e prioridade na pesquisa.
 


AGRADECIMENTOS

    Esta pesquisa foi possível pela ajuda da FAPESP (Brasil). Os autores  agradecem o Dr. Dirk Koedam e a Dra. Márcia de Fátima Ribeiro pelas suas críticas e sugestões. Pela identificação taxonômica agradecem a Vitor Becker, especialista em microlepidoptera. Especial agradecimento ao MSc. Sergio Hilário Dias pela correção linguística deste manuscrito.
 
 

REFERÊNCIAS



Anderson, D.L.   1990   Pests and Pathogens of the Honey Bee (Apis mellifera L.) in Fiji   J. Apic. Res. 29(1):53-59

Bailey, L.   1981   Honey bee pathology   Academic Press   London   124 pp

Crane, E.   1990   Bees and Beekeeping. Science, Practice and World Resources   1st ed. Heinemann Newnes   614 pp

Guerra, M. de S.   1973   Bionomia das traças de cera (Galleria mellonella L. e Achroia grisella F. Lepidoptera, Galleridae) no Municipio de Piracicaba, São Paulo.  Dissertação de Mestrado   ESALQ-USP   133 pp.

Morse, R.A.   1978   Honey Bee Pests, Predators, and Diseases  1st ed   Cornell Univ. Press   430 pp

Nogueira-Neto, P.   1997   Vida e criação de abelhas indígenas sem ferrão   Editora Nogueirapis   São Paulo   445pp

OIRSA – BID   1988   Manejo y control de la abeja africanizada   Programa Regional para el Manejo y Control de la Abeja Africanizada. El Salvador  229 pp

Schenk, E.   1938   O apicultor brasileiro. Guia completo de Apicultura no Brasil 7th ed. 320 pp

Singh, S.   1962   Beekeeping in India   Indian Council of Agricultural Research  New Delhi 1st edi. 214 pp.


 
 

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