Artigo

O Refúgio das Abelhas "Paulo Nogueira-Neto"

Marilda Cortopassi-Laurino
Laboratório de Abelhas-USP-SP (mclaurin@usp.br)

Em viagem realizada para a Chapada do Araripe, em maio de 2009, tivemos a oportunidade de conhecer o "Refugio das Abelhas Paulo Nogueira-Neto" de propriedade do casal Selma e Chagas, em sociedade com Tertuliano Aires Neto outro apaixonado pelas abelhas sem ferrão e antigos amigos meliponicultores da região de Igarassu-PE e Natal-RN respectivamente.

Os objetivos da criação e implantação deste refúgio visam principalmente a preservação das abelhas nativas apoiados nos seguintes itens: 1. Aprender o manejo de M.quinquefasciata, a uruçu do chão, na sua região de origem, 2. Criar e reproduzir varias espécies de Melipona nativas da região como mandacaia, asilvai e subnitida, conhecidas popularmente como, mandacaia, rajada e jandaira e da uruçu e uruçu-amarela (M.scutellaris e M.rufiventris) 3. divulgar junto aos interessados da região o manejo destas abelhas, 4. Difundir a meliponicultura na região, 5. Apoiar pequenos criadores já existentes e 6. Tornar-se um ponto de apoio para pesquisas científicas.

Os meliponários de uruçu e de uruçu-amarela já estão implantados e varias destas abelhas foram observadas na natureza coletando resina ou goma de um cipó conhecido como mucunã, (Dioclea violaceae), uma leguminosa com grandes sementes redondas usadas em bijuterias e também coletando barro do chão, pois estávamos na estação das chuvas. Outras plantas apícolas da região visitadas por meliponineos foram a flor de besouro (Senna cearensis) onde a uruçu amarela coletava pólen vibrando as anteras poricidas e lagarteiro (Colubrina sp) onde a a mandaguari coletava pólen e a uruçu do chão coletava néctar junto com Apis mellifera. Logo pela manhã, ainda foram observadas muitas trigonas juntas, coletando pólen nas flores orvalhadas da abobreira.

Sobre o manejo da uruçu do chão é importante também salientar que a espessura das caixas destes ninhos é maior do que a das outras espécies manejadas e estão sendo testadas caixas com conexão para o solo e com gaveta inferior preenchidas de barro.

Sobre os sexuados foram observadas rainhas jovens ou princesas de jandaira e de uruçu amarela dentro dos ninhos. E no ambiente, machos de mandacaia além de um macho de uruçu amarela junto do aglomerado dos machos de uruçu. Este aglomerado esteve presente ao longo todo o dia em frente às caixas desta espécie.O néctar regurgitado destes machos de uruçu tinham concentração entre 21 e 26% próximo ao meio dia, com temperatura ambiente de 27ºC e 69% de umidade relativa.

Na região, ao longo do ano são reconhecidas três grandes floradas apícolas: a de cipó-uva em dezembro, de canelinha e banha em abril e de cidreira brava em junho/julho. Entretanto, na região existem muitas outras plantas apícolas como as mucunã, chacua, angelim, lagarteiro, cain, mororó, murici de árvore, cipó-uva=croapé, pitomba, cidreira, camara, marmeleiro, mandacaru=cardeiro, cajuzinho, cambuí, pau d' óleo, faveira, visgueira, laranjinha, cipó-branco, flor de besouro, velame e camuzé=angico.

Durante esta viagem ao refugio, tivemos também a oportunidade de visitar outros criadores de abelhas nativas da região, entre eles o Sr. Ernani Sebastião Fernandes que nos mostrou na natureza um piquizeiro caído com ninhos de jandaira e de moça branca e um ninho de uruçu do chão debaixo de uma mata arbustiva.

O Sr. Antonio José da Silva, que também é poeta, nos informou que as árvores amarelo, copaíba, visgueiro, jatobá e pequi são as preferidas pelas abelhas na região para nidificar. Além disso, mostrou vários ninhos de meliponíneos na respectiva árvore que estão tabelados abaixo.

Tabela


Outras curiosidades contadas pelo Sr. Antonio são de que a abelha cupira freqüentemente faz ninho em cupinzeiro só quando este se instala no alto dos cactos mandacarus.E se o inverno é bom seu ninho apresenta muitas capas ou seja, camadas de cerume. Sobre a manduri, se o ninho se instala em oco grande, os potes circundam o favo como um bolo, entretanto se o oco é pequeno, os favos ficam sempre debaixo dos potes de alimento.

Sobre a M.mandacaia o Sr. Sergio de Juazeirinho, nos informou que ela nidifica com freqüência em árvores do umbuzeiro e da catingueira e que neste mês de maio ocorreu um enxame para caixa racional.

Aqui, vale salientar a iniciativa para preservar a uruçu do chão do Sr. Dedu visitado há dois anos e também morador da Chapada. Sem qualquer conhecimento de manejo, após coletar o mel ele colocava os ninhos em caixas quadradas de madeira, (de tamanho semelhante ao tamanho dos ninhos) as quais recobria, internamente e antecipadamente, com barro porque era como ele os encontrava na natureza. Ele mostrou sua percepção de preservação porque constatou, ano após ano, que os ninhos destas abelhas estão diminuindo na natureza onde ele reside ha tantos anos.

Agradecimentos especiais ao casal Selma e Chagas pela acolhida tão calorosa neste paraíso das abelhas, ao Wilmar Taveira pelas informações das plantas apícolas e aos meliponicultores que nos receberam e nos passaram várias informações tão preciosas para a preservação destas abelhas na sua região de origem.

Ilustrações:

Sr. Ernani Sebastião Fernandez e família, grande conhecedor de meliponíneos da região da Chapada do Araripe e principalmente da uruçu do chão. Estão acompanhados do Sr. Francisco das Chagas e esposa Selma e Wilmar. Foto Marilda Cortopassi-Laurino.

O filho Rubwanio da Silva, o poeta e conhecedor de meliponíneos da região da Chapada do Araripe, Sr. Antonio José da Silva, Marilda Cortopassi-Laurino, Francisco das Chagas e Wilmar Taveira, este, um grande identificador das plantas da região além de conhecedor das suas propriedades medicinais. Foto Marilda Cortopassi-Laurino.

Invenção do Sr. Francisco das Chagas: A conexão entre o solo e a caixa foi confeccionada especialmente para as abelhas uruçu do chão e está sendo testada na sua região de origem. Foto Marilda Cortopassi-Laurino.

Inspeção em um dos meliponários do "refugio das abelhas" na região da Chapada do Araripe-PE. Foto Marilda Cortopassi-Laurino.

Uruçu amarela coletando pólen nas anteras poricidas da flor de besouro. Depois de vibrar as anteras, as abelhas recolhem os grãos de pólen que ficaram aderidos nos pelos do seu próprio corpo e os transportam nas corbículas para o ninho. Foto Marilda Cortopassi-Laurino.


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